domingo, 28 de julho de 2013

Liberdade e segurança

Num belo texto que merece uma leitura completa, se possível no original, o juiz Andrew Napolitano desmonta a tentativa, abusiva, daqueles que pretendem equiparar a liberdade e a segurança a propósito do "caso" Edward Snowden. A tradução, particularmente arriscada, é minha.
"Quando Edward Snowden revelou que o governo federal, num desafio directo à Quarta Emenda da Constituição, estava ilícita e inconstitucionalmente a espiar todos os americanos que usam telefones, mensagens de texto ou e-mails para comunicar com outras pessoas, ele abriu uma caixa de Pandora de alegações e recriminações. As alegações que desencadeou são as de que os americanos têm um governo que assalta as nossas liberdades pessoais, actua em segredo e viola a Constituição e os valores em que ela se baseia. As recriminações são as de que a segurança é um bem maior do que a liberdade, e Snowden interferiu na capacidade do governo para nos manter seguros, expondo os seus segredos, e por isso deve ser silenciado e punido.

No decorrer deste debate, já se ouviu o argumento de que todos nós precisamos de sacrificar alguma liberdade de modo a garantir a nossa segurança, que a liberdade e a segurança são contrapesos que, quando chocam entre si, é ao governo que deve assegurar um novo equilíbrio decidindo qual deverá prevalecer. Este é, naturalmente, um argumento que o governo adora, pois pressupõe que o governo tem o poder moral, legal e constitucional para fazer esse rearranjo satânico.

Ora ele não tem esse poder.



Os imperadores romanos e chefes tribais, o rei Jorge III e os revolucionários franceses, os ditadores do século XX e os presidentes americanos do século XXI todos eles afirmaram que a sua primeira tarefa é a de nos manter seguros e, dessa forma, com o direito a, de alguma forma, nos retirar as nossas liberdades, seja o discurso que odeiam ou temem, a privacidade que caprichosamente gostam de invadir ou a riqueza e propriedade privadas que impudicamente cobiçam.

Este argumento é antitético ao valor principal sobre o qual a América foi fundada. Esse valor é simplesmente o de que os indivíduos - criados à imagem e à semelhança de Deus e como tal possuidores das liberdades que Ele desfruta e partilhou connosco - são os criadores do governo. Um soberano é a fonte dos seus poderes O governo não é soberano. Toda a liberdade que os indivíduos possuem, foi recebida como uma dádiva de Deus, que é o único verdadeiro soberano. Todos os poderes que o governo dispõe recebeu-os de nós, dos nossos repositórios pessoais de liberdade.

Thomas Jefferson reconheceu isto quando escreveu na Declaração de Independência que os nossos direitos são inalienáveis - que não podem ser separados de nós - porque nos foram dotados pelo nosso Criador. James Madison, que escreveu a Constituição, observou que no decurso da história do mundo, quando a liberdade foi conquistada, tal aconteceu porque os detentores do poder relutantemente permitiram a liberdade como condição para permanecer no poder ou até mesmo para permanecer vivos.

Mas não na América.

Na América, o oposto ocorreu quando pessoas livres voluntariamente permitiram ao governo exercer o poder limitado necessário à protecção da liberdade Isso é conhecido como "o consentimento dos governados". Para Jefferson e Madison, um governo onde esse consentimento não exista é ilegítimo.

Assim, o principal autor da Declaração da Independência e principal autor da Constituição concordaram sobre isto: todas as pessoas são por natureza livres e, para preservar essas liberdades, elas autorizaram a existência de um governo. Esse foi o governo que elas nos deram - não o poder que permite a liberdade, mas a liberdade de permitir o poder - e o instrumento dessa permissão foi a Constituição.

A Constituição foi criada por homens livres para definir e limitar o governo para que ele possa defender mas não ameaçar as nossas liberdades. Uma vez que apenas as pessoas livres podem consentir num governo, o governo não pode existir legalmente sem esses consentimentos. É aqui que os tiranos dos tempos modernos e apologistas do big-government têm conseguido confundir pessoas bem-intencionadas. Eles elevaram a segurança - que é um objectivo do governo - ao nível da liberdade - que criou o governo. Este argumento comum e obtuso torna a criatura - a segurança - igual ao seu criador - a liberdade. Isso é uma impossibilidade metafísica porque pressupõe que o bem a ser adquirido é de alguma forma igual às escolhas livres do comprador.

O que significa isto?

Isto significa que quando os políticos dizem que a liberdade e a segurança necessitam ser equilibradas entre si, eles estão filosoficamente, historicamente e constitucionalmente errados. A liberdade é a posição normal. A liberdade é a essência da nossa condição natural. A liberdade não pode ser igual a um bem que nós instruímos o governo a obter.

Qual é a única relação moral entre liberdade e segurança?

Não pode ser a de equilíbrio, porque a liberdade e segurança não são iguais, uma vez que uma criou a outra. Só pode ser a de uma inclinação contínua para com a liberdade e pela preferência pela liberdade.

Cada confronto concebível entre as escolhas livres das pessoas e as suas instruções ao seu governo para salvaguardar a liberdade deve favorecer as escolhas livres, porque a liberdade é inalienável. Tal como eu não posso autorizar o governo a retirar-lhe a si a sua liberdade exactamente como você não pode autorizá-lo a retirar-me a minha, uma maioria de todos menos um não pode autorizar o governo numa sociedade livre a retirar a liberdade a esse indivíduo. Assim, se de alguma forma a liberdade e a segurança entrarem em conflito, é da livre escolha de cada pessoa resolver esse conflito por si mesma, e não uma escolha que o governo possa moralmente tomar.

O governo sempre fará escolhas que favoreçam o seu poder porque, como Ludwig von Mises nos recordou, o governo é, essencialmente, a negação da liberdade. Se alguém na realidade acredita que pelo seu silenciamento, monitorização ou tributação o governo o manterá em segurança, e que esses são os meios menos restritivos para o conseguir, então que se deixe que essa pessoa renuncie à sua própria palavra, à sua privacidade e riqueza. Os restantes de nós manteremos as nossas e proporcionaremos a nossa própria segurança.

As razões por que temos consentido num governo limitado são para preservar a liberdade na busca da felicidade, a liberdade de ser diferente e a liberdade de ser deixado em paz. Nenhuma dessas liberdades pode existir se nós formos subservientes para com o governo em nome da segurança ou de qualquer outra coisa."

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