segunda-feira, 31 de março de 2014

Vislumbra-se o Guião

Por vezes as provas de que convivemos numa realidade encenada tornam-se visíveis. Como pequenas parcelas de produção artística que se tornam públicas contra a vontade dos seus autores. Por mim, esforços que mostrem os movimentos e cadências dessa peça são esforços louváveis.
Os escassos minutos que se seguem são de uma clareza incontornável (ambos daqui). No primeiro destes pequenos vídeos podemos constatar a admissão dos ensaios gerais a que a imprensa se submete, dando conta do que o poder quer que as pessoas saibam.
No segundo caso, chama-se a atenção para uma manobra de manipulação que deixaria Estaline e Hitler, seguramente, invejosos - envolver Hollywood na promoção do programa Obamacare. Os publicitários chamam-lhe "product placement" quando um programa mostra produtos de marcas que o patrocinam. Será esse o caso? Ou o patrocínio é intelectual e moral?
Chamo a atenção para a docilidade, para o beneplácito de dois apresentadores de televisão que mais parecem bonecos. Atente-se, igualmente, na sobranceria da conselheira de Obama, na narrativa de quem padece (como uma mãe?) com outro que sofre. Aterrador.
Não devemos esquecer, o que conta é a peça.

domingo, 30 de março de 2014

Citação do dia (159)

"O único objectivo da prática política é o de manter a população alarmada (e, portanto, clamando para que a conduzam à segurança), ameaçando-a com uma interminável série de papões, todos eles imaginários."
H. L. Mencken

sexta-feira, 28 de março de 2014

A Morte da Moeda

Tenho trazido à consideração dos leitores a temática da reformulação do sistema monetário internacional. Assinalei também alguns dos contornos que este tema possui (aqui e aqui). Publica-se agora a tradução da entrevista realizada por Koos Jansen a James Rickards a propósito da publicação do seu livro - "The Death of Money" (lançamento internacional a 3 de Abril e sem tradução portuguesa prevista) - que tem, como pano de fundo, a situação difícil do sistema monetário e financeiro internacional e as possibilidades da sua evolução, articulando com precisão o papel das grandes potências económicas (presentes e futuras), a função disciplinadora do ouro e alguns dos argumentos da Escola Austríaca de economia.
A tradução é da minha responsabilidade, bem como algumas observações ou sublinhados.

Willem Middelkoop, Koos Jansen e James Rickards


James Rickards e "A morte do dinheiro" - 14 de Março de 2014

Koos Jansen – Considera que haverá um colapso do sistema monetário global, acompanhado de caos social e problemas nos bancos face ao que os políticos não estão a fazer ou farão tarde demais?
James Rickards – O meu livro mais recente – The Death of Money – é, justamente, acerca da morte do dólar. Um colapso monetário global e o colapso do dólar são uma e a mesma coisa. O dólar é a chave do actual sistema, ora se o mundo deixar de ter confiança nessa chave, então, o sistema como o conhecemos entra em derrocada.
Se ocorrerão distúrbios a acompanhar esse colapso? Bem, penso que eles já estão a acontecer. Veja-se a Ucrânia, a Crimeia. A China está a enviar navios para o largo das ilhas que disputa com o Japão. Podemos ver também tensões e conflitos associados à primavera árabe por causa disso. É inegável que há sinais preocupantes em diversas regiões. Considero que os políticos vão continuar a prosseguir políticas erradas, não julgo que façam as reformas e ajustes necessários: o desemprego continua alto, o crescimento continua anémico e o perigo de deflação está à espreita. Estes fenómenos potenciam a instabilidade social, as disparidades no rendimento e riqueza. Assistiremos ao agudizar destes problemas durante o definhar do sistema.
Os bancos centrais e os governos já disseram que os maiores bancos e instituições finaceiras não podem cair. Isto impedirá, igualmente, que as correcções aconteçam. Quais são as consequências que conhecemos dessas decisões? Bom, isso convida a práticas irresponsáveis e a posturas parasitárias por parte dos banqueiros. Isso permite que eles cresçam e que destabilizem o sistema. Julgo que não veremos, para já, falências de grandes bancos, no entanto, quando o colapso acontecer alguns deles vão cair. É a própria política dos grandes demais para cair que conduz ao agravamento das disfunções no sistema e isso levará ao colapso.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Veneza e o movimento secessionista

Como tinha anunciado, depois de ter apresentado uma visão pessimista de Pat Buchanan relativamente ao futuro da Velha Europa, de que a emergência dos movimentos secessionistas e potencial fragmentação do status quo dos estados correspondentes seria um evidente sinal, eis um artigo que, a propósito do referendo de Domingo passado em Veneza, olha para o conceito de secessão como algo para além do benévolo - para o desejável. Para o efeito, Ryan McMaken socorre-se de Hans-Hermann Hoppe.

Actualização ex ante: especialmente para os cépticos do significado jurídico do referendo, ler aqui.
24 de Março de 2014
Por Ryan McMaken

A secessão de Veneza da Itália, Hans-Hermann Hoppe e os estados-nação

Com uma expressão maioritária de 89%, os eleitores de Veneza optaram pela secessão da Itália. Na prática, o que isso significa é que os venezianos pretendem deixar de remeter a receita fiscal para Roma. Aparentemente, os venezianos, que habitam a capital histórica de uma das repúblicas mais ricas e florescentes da humanidade, não pretendem continuar a subsidiar os burocratas de Roma, famosos pela corrupção. Há muito que a Itália do Sul é considerada pela mais rica, mais limpa e mais eficiente Itália do Norte como um sorvedouro dos seus recursos. Pelo menos de acordo com o Daily Mail, já se fala também em alargar o movimento de secessão a outras áreas do Norte.

Um dos pró-secessionistas parece-se mesmo com um Hoppeano:

Um dos activistas do movimento pela secessão, Paolo Bernardini, professor de História Europeia na Universidade de Insubria, na região do Como, no norte da Itália, disse que chegara "a altura" de Veneza se tornar novamente num estado autónomo.
"Embora a história nunca se repita, estamos agora a assistir a um forte regresso das pequenas nações, dos pequenos e prósperos países, capazes de interagir entre si no mundo global."
“O povo de Veneza percebeu que somos uma nação (digna de) se auto-governar e que está a ser publicamente oprimida, e o mundo inteiro está a caminhar em direcção à fragmentação - uma fragmentação positiva - onde as tradições locais se misturam com os mercados globais.”
Naturalmente, os grandes estados-nação da Europa odeiam e temem desenvolvimentos como este. Mas para quem consiga lembrar-se da História, há nela pouca "tradição" que os estados-nação possam reivindicar. A Itália é um país inventado, tal como a Alemanha, amalgamados à força no século XIX por poderosos políticos autoritários como Otto von Bismarck, que, evidentemente, odiava o liberalismo clássico e o capitalismo com toda a força do seu ser.

quarta-feira, 26 de março de 2014

Pat Buchanan e o movimento secessionista na Europa

E, "de repente", o movimento secessionista na Europa vê-se significativamente reforçado com o resultado iniludível do referendo em Veneza, ainda que não vinculativo. Se a ele juntarmos o mais que provável "sim" por parte da Escócia no próximo Outono, conjugado no tempo (Novembro) com um outro relativo à Catalunha marcado por fortes tensões com o governo central, não me espantaria que a chama secessionista se alastrasse rapidamente no continente europeu (com a Bélgica e outras regiões da Itália, como a Sardenha,como sérios  candidatos.

Pat Buchanan, em artigo que achei oportuno traduzir, procura explicar as razões desta irrupção que, na sua leitura, são sinais de um problema mais vasto que o autor abordou em Suicide of a SuperPower referindo-se naturalmente aos EUA: a "centrifugação" dos EUA decorrente da não miscigenação das últimas gerações de imigrantes no que até então tinha sido o grande e bem-sucedido melting pot.

Não partilho inteiramente das teses de Buchanan embora tenda a concordar que os modernos estados de bem-estar - que alguém, em última análise, terá sempre que pagar - forneçam incentivos à imigração em massa e, com isso, se abram caminhos a verdadeiros combates demográficos e consequentes tensões culturais e religiosas. Só não os verá quem não quiser ver.

Num próximo post, e relativamente ao movimento secessionista, irei reproduzir um ponto de vista bem mais optimista que o de Buchanan que o encara, tal como eu tendo a concordar, como algo de bem positivo como já tive oportunidade de o escrever.
25 de Março de 2014
Por Patrick J. Buchanan

Os laços europeus começam a desvanecer-se
(Europe’s Bonds Begin to Fade)

Patrick J. Buchanan
Há uma semana atrás, no Salão de São Jorge no Kremlin, a elite russa aplaudiu e chorou quando Vladimir Putin anunciou a reanexação da Crimeia. Sete em cada 10 russos aprovam a governação de Putin. Na Crimeia, a maioria russa ainda não parou de celebrar. A reconquista aproxima-se da conclusão. No leste da Ucrânia, os russos começaram agora a promover a agitação pela anexação por Moscovo. O nacionalismo ucraniano, manifesto no golpe anti-Rússia verificado em Kiev, provocou a inevitável reacção entre os russos. Apesar de elogiar os ucranianos que foram até à Maidan protestar pacificamente, Putin disse que aqueles por trás dos acontecimentos decisivos "recorreram ao terror, assassinato e tumultos. Nacionalistas, neonazis, russófobos e anti-semitas levaram a cabo este golpe". O Kremlin irrompeu em aplausos.

Mas não é apenas na Ucrânia que o nacionalismo étnico está a crescer.

"A votação na Frente Nacional atordoa Hollande" [registo prévio necessário] foi a manchete do Financial Times relativa às eleições municipais francesas no Domingo. Embora a FN de Marine Le Pen, filha do fundador do partido Jean Marie Le Pen, não se tenha candidatado em muitas cidades, ela ganhou em definitivo a corrida à presidência da câmara em Henin-Beaumont e ficou em primeiro ou segundo lugar numa dúzia de cidades de média dimensão, pelo que disputará a segunda volta nas eleições de 30 de Março. "A Frente Nacional alcançou o estatuto de grande força independente - uma força política nos planos nacional e local", declarou Le Pen.

terça-feira, 25 de março de 2014

Rumores

A notícia revela sinais de pequenos ajustamentos (condição natural para defensores do mercado livre) ou tremores que antecipam um movimento tectónico maior? É irónico que seja um jornal norte-americano a proceder à sua divulgação.
Novas dimensões da realidade encenada?

segunda-feira, 24 de março de 2014

Boletim meteorológico para ontem

Foi o título que roubei da crónica de José Diogo Quintela no Público de ontem, a propósito deste estudo sobre o "clima" em Portugal nos últimos 350 anos, de que destaco uns excertos:
"(...) Parece que as ondas que arrasaram a costa no Inverno de 2014 foram iguais às que em 1814, no Inverno, a costa arrasaram.

Trata-se, portanto, de vagalhões pleonásticos acompanhados por redundantes rajadas na ordem dos 170 km/h. E que nos colocam perante uma evidência. Se, no início do século XIX, muito antes das emissões de CO2 atingirem os níveis actuais, ocorriam já estas tempestades violentas, só pode significar que o aquecimento global antropogénico não influencia apenas o presente e o futuro, ele afecta também o passado.
(...)
O poder do aquecimento global nas recordações é assustador: numa fotografa de 1980, em que eu estava na praia a brincar nas pocinhas com água pelos tornozelos, estou agora completamente submerso. Como se sabe, o aquecimento retroactivo do nível do mar é um dos efeitos mais perniciosos do aquecimento global viajante no tempo. Se o aquecimento global continuar a causar cataclismos pretéritos, o que vai ser dos álbuns fotográficos da minha mãe?"
Exactamente.

domingo, 23 de março de 2014

Apesar de Obama, uma revolução energética nos EUA

O extraordinário recrudescimento na exploração de gás natural e petróleo nos EUA, tornado possível pelo desenvolvimento do fracking (fracturação hidráulica) e da perfuração horizontal, vem ocorrendo em terrenos na posse de privados e dos estados federados. Ao invés, nos terrenos federais, o que se tem verificado é a redução dos níveis de produção. E, ironia das ironias, tudo isto sem prejuízo de, em simultâneo, se ter verificado uma acentuada redução nas emissões de dióxido de carbono um poluente alimento das plantas. Obama reclama para si créditos por estes resultados (entre os quais as novas centenas de milhar de empregos) pretendendo com isso fazer passar a ideia falsa que as "novas renováveis" tenham tido algum impacto significativo nesta evolução. Uma dúzia de minutos fascinantes. (Via Carpe Diem)

sexta-feira, 21 de março de 2014

Citação do dia (158)

Agradecendo a CN pela chamada de atenção.
"Os ricos do topo da pirâmide são keynesianos. São devotos do templo de Keynes. (...) O keynesianismo tem as características de uma religião. Tem uma confissão: "A moeda fiat supera as recessões". Tem uma agenda: a salvação através do crescimento económico. Tem uma doutrina da omnisciência: o planeamento central monetário. Tem um clero: os economistas doutorados. Tem um movimento evangélico: o levado a cabo pelo Congresso, pelas universidades e pelos media do mainstream."

quarta-feira, 19 de março de 2014

Pat Buchanan: Quem é e o que é Vladimir Putin?

Encaro a secessão como um direito conexo ao direito natural (*) quer no plano das nações quer no plano individual que se poderá traduzir no direito a ser deixado em paz. Tenho assim por essencialmente benévola a leitura dos acontecimentos na Crimeia como de resto sucede quanto a outros processos secessionistas hoje em curso, até agora conduzidos por meios essencialmente pacíficos, como é o caso da Escócia, da Catalunha, de Veneza ou mesmo... de Vigo.

Se por momentos nos lembrarmos que: a própria América nasceu de um processo secessionista a cuja justeza se alude veementemente na Declaração de Independência; que Woodrow Wilson, nomeadamente no seu famoso discurso dos "quatorze pontos", impôs promoveu o estilhaçar dos impérios dos Hohenzollern e Habsburgos e redesenhou fronteiras e criou países em nome da "libertação dos povos" da Europa (pulverizando extensas populações germânicas pelo caminho...) e que o que aconteceu no Kosovo, em 1999, não caiu totalmente no esquecimento, parece-me difícil sustentar um outro ponto de vista. Tanto mais que a única alternativa enunciada, de forma ínvia ou desabrida, é o acentuar do cerco geopolítico (via NATO) à Rússia. E bem sabemos a que conduziu a política do cerco às potências centrais na Europa nos anos que antecederam a I Guerra Mundial.

Pat Buchanan, com a sua habitual frieza analítica e excelente memória histórica, é uma leitura particularmente aconselhável nos domínios da política externa quando as emoções (e a propaganda) se pretendem sobrepôr à razão. Daí o convite ao leitor que adiante se segue, resultado da tradução, da minha responsabilidade, deste texto de Buchanan.
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(*) Para uma incursão de índole filosófica neste tema, atente-se neste artigo de David Gordon ou nesta entrada da Wikipedia.
17 de Março de 2014
Por Patrick J. Buchanan

Quem é e o que é Vladimir Putin? (Who and What is Vladimir Putin?)

Vladimir Putin parece ter perdido o sentido da realidade, terá dito Angela Merkel a Barack Obama após ter falado com o presidente russo. Ele está "num outro mundo". "Concordo com o que Angela Merkel disse... que ele vive num outro mundo", declarou Madeleine Albright, "Isso não faz nenhum sentido". John Kerry deu o seu contributo para esta tonta teoria insinuando que Putin estava a seguir os passos de Napoleão: "Muito simplesmente, não é possível, no século XXI, comportar-se à moda do século XIX ao invadir um outro país sob um pretexto completamente forjado."

Patrick J. Buchanan
Agora que Putin assumiu o controlo da Crimeia sem disparar um tiro, e que 95% do eleitorado da Crimeia votou no Domingo pela reintegração na Rússia, será que as suas decisões continuam a parecer irracionais? Não seria previsível que a Rússia, uma grande potência que tinha acabado de ver o seu vizinho ser puxado para fora da órbita da Rússia por um golpe apoiado pelos EUA em Kiev, iria reagir para proteger uma posição estratégica no Mar Negro que mantém há dois séculos? Zbigniew Brzezinski sugere que Putin tem por objectivo recriar o império czarista. Outros dizem que Putin pretende recriar a União Soviética e o Império Soviético.

Mas por que razão a Rússia, hoje envolvida em sangrentas guerras secessionistas com terroristas muçulmanos nas províncias do norte do Cáucaso da Chechénia, do Daguestão e da Ingúchia, quereria invadir e reanexar o gigante Cazaquistão, ou qualquer outra república muçulmana da antiga URSS, o que garantiria a intervenção jihadista e uma guerra interminável? Se nós, americanos, queremos sair do Afeganistão, por que quereria Putin voltar ao Uzbequistão? Por que quereria ele anexar a Ucrânia Ocidental onde o ódio à Rússia remonta à fome organizada da era stalinista? A invasão e ocupação de toda a Ucrânia implicaria para Moscovo incorrer em custos infindáveis em sangue e dinheiro, a inimizade da Europa, e a hostilidade dos Estados Unidos. Qual seria o objectivo da Rússia, cuja população está a diminuir à razão de meio milhão por ano, de pretender voltar a ter soldados russos em Varsóvia?

Mas se Putin não é um imperialista russo que visa restabelecer o domínio russo sobre os povos não-russos, quem é e o que é ele?

A Grande Guerra 1914-1918 – Algumas notas e fragmentos (VI)


Retomando o tema da Iª Grande Guerra, publicamos o testemunho de David Stockman. Este texto é apenas uma pequena parte de um ensaio maior (ver título no final) que o autor elaborou e publicou na sua mais recente plataforma de comunicação. Não podemos deixar de recomendar a visita e a leitura de tão rico espaço de reflexão, que conta também com contributos de John Butler, Michael Krieger, Detlev Schlichter e Mike "Mish" Shedlock, entre outros.

Retomam-se as relações já experimentadas (aqui) na tentativa de dirigir a atenção às raízes dos actos da peça que ainda hoje pautam a nossa vida colectiva.
A Grande Guerra e o seu legado, por David Stockman

"O meu propósito aqui é elaborar um esboço do que foi a longa história da Iª Grande Guerra, começando, precisamente, há cem anos. Nesse mesmo ano, a Reserva Federal (FED) abria as suas portas enquanto a carnificina decorria no norte de França, o que acabou por encerrar um período de meio século de liberalismo internacionalista e de dinheiro honesto suportado pelo ouro.

sábado, 15 de março de 2014

Young Guns of Gold - a reunião de Março

Um mês passou e partilhamos mais uma reunião da nova geração de analistas do mercado dos metais preciosos. Nesta edição de Março, a mesa redonda regista a ausência de Tekoa da Silva. Especulando um pouco, talvez a mudança para a equipa de Rick Rule na Sprott GRI esteja a ser de tal forma intensa que não deixa energia para mais iniciativas. Assim sendo, esta quarta reunião das novas armas de ouro conta com Jan Skoyles (da Real Asset Company), Ronald Stoeferle (Incrementum AG) e Jordan Eliseo (ABC Bullion). Os seguintes temas são discutidos:


sexta-feira, 14 de março de 2014

Citação do dia (157)

"Eu sou um optimista, não um conspirador. Acontece que considero que a estrada para o inferno está repleta de boas intenções. Em função disso, compro ouro."

quinta-feira, 13 de março de 2014

Mas afinal onde pára a austeridade?

No magnífico post que o meu colega de blogue deu ontem à estampa, somos persuasivamente convidados a que não confundamos as peculiaridades da encenação e dos seus episódios laterais, com o guião "dorsal" da peça que se vem desenrolando.

Peça deste jogo de espelhos vem sendo reservada à "austeridade". Para uns, ela tem sido a receita adequada e a causa primeira da obtenção de resultados encorajadores (aumento das exportações, queda na taxa de desemprego, redução do défice orçamental em percentagem do PIB, menores custos de financiamento na emissão de nova dívida pública, etc.); para outros, depois de nos ter colocado numa rota de "espiral recessiva", a continuação da austeridade impede-nos agora de retomar o "caminho de crescimento" (através de mais défice/dívida por conta dos supostamente indispensáveis "investimentos" públicos de "estímulo" à economia). O manifesto dos 70 enquadra-se neste último grupo pois na realidade a "reestruturação" da dívida pública que os seus subscritores propõem é meramente instrumental no acomodar de (ainda) mais despesa pública. Tão só e apenas.

Sendo certo que, como Mark Thornton recordava, há três formas de austeridade e, numa delas, até se encara seriamente a hipótese de repúdio da dívida pública (sem iludir as consequências dessa via), importa ter presente uma clarificação adicional quanto à "narrativa" da austeridade. É o que David Howden faz no texto Where's the Austerity? cuja tradução, de minha responsabilidade, se segue.

(Entretanto, assinei este outro manifesto por força do que aqui se alude ironicamente.)
10 de Março de 2014
Por David Howden

A dívida global já ultrapassa 100 milhões de milhões (trillions) de dólares, segundo o Banco de Pagamentos Internacionais[1]. Ao longo dos últimos cinco anos, a dívida aumentou em cerca de 30 trillions de dólares. E, saliente-se, os maiores emitentes de dívida foram os estados.

As baixas taxas de juros atraíram os governos a recorrer à dívida para financiar os projectos públicos do presente. Ora, como se costuma dizer, não há almoços grátis. A certa altura, essa dívida terá de ser paga. Na melhor das hipóteses, tudo o que esses governos fizeram foi deslocar despesa para o futuro à custa das gerações futuras em benefício das gerações actuais.

terça-feira, 11 de março de 2014

O que importa é a peça

Comunicação e mercado – guião e coreografia

O texto que a seguir se traduz é um exercício para identificar a natureza do guião da verdade oficializada. É uma tentativa de elencar os movimentos daquilo que, parecendo desconexo ou contraditório, acontece no palco daquela verdade alinhavada.

Parte de um texto maior, que desde já convidamos os leitores a considerar, é um convite a considerar aquilo que não é manifesto nos actos e nas palavras daqueles que levam a cabo a encenação de um guião que acabará por determinar o conteúdo da própria opinião pública acerca do que acontece. Esse guião oficial transporta, no desenrolar da sua encenação, as ferramentas da sua descodificação, semelhante a um ready-made. O guião contém os parâmetros da sua compreensão partilhada.

Os agentes dessa peça comunitária são políticos, empresários do regime, economistas, jornalistas ou governadores de bancos centrais. Acrescentaria também comentadores, de ofícios vários, mas que ocupam um lugar nos canais de comunicação convencionais.

Antes de avançarmos, tenhamos presentes alguns actos que vão enriquecendo a trama. Comecemos por considerar a seguinte peça jornalística. Dela destaco apenas uma passagem, que traduzo: "Fratzscher disse que o BCE deveria comprar dívida de todos os países da zona euro - incluindo da Alemanha - numa base proporcional para retirar toda a Zona Euro do baixio onde se encontra." Já aqui se fez referência à decisão do tribunal alemão em descartar responsabilidades na condenação ao BCE e às suas acções para salvar o euro.

Na semana passada, Draghi aludiu a uma ilha de estabilidade quando se referiu ao euro e este encontra-se em máximos de três anos face ao dólar. O que numa economia que está "nos baixios" não permite antecipar nada de bom.

Barroso (re)afirmou recentemente que a crise estava para trás. Registam-se descidas importantes nos juros da dívida portuguesa (e não só). Vemos tudo isto, mas sabemos porque sucedem estas cenas? Por exemplo, sabemos como podem os países em grandes dificuldades financeiras (e respectivas junk bonds), numa economia que está "nos baixios", ter os seus juros a baixar?

O que nos diz o guião acerca disso?
Há uma tendência a tratar a comunicação económica – seja de um famoso director geral, de um conhecido investidor, economista ou governador de um banco central – como sendo depurada da natureza teatral, sem alcance cénico ou atenção coreográfica para além da sua expressão política imediata. Mas isto é um erro.

As eólicas e o monstro eléctrico

Mão amiga fez-me chegar cópia do artigo que o Engº Mira Amaral publicou no Expresso deste último sábado com o título que tomei emprestado (acrescentado de uma consoante "muda") para este post. É mais um elucidativo exercício de recapitulação da matéria dada: a insanidade da política seguida entre nós no domínio da produção de energia eléctrica e, em particular, do seu pilar eólico, exemplo acabado da pior conjugação possível - o favorecimento político de uma agenda ambiental politicamente correcta e economicamente desastrosa com o casamento de conveniência com as empresas [e bancos...] de "regime", na feliz expressão de Henrique Neto.

Introduzi dois links no texto original que, lamentavelmente, se manifesta em "acordês". Um deles, remete para um documento da ERSE que só muito, muito raramente surge à "superfície" e que todavia é essencial para compreender por que sobe sistematicamente o preço da electricidade (e o défice tarifário...); o outro, que fiquei a conhecer pela referência do Engº Mira Amaral, aponta para uma apresentação que o Prof. Clemente Nunes levou a cabo na Ordem dos Engenheiros, no passado mês de Fevereiro, intitulada "Política Energética e Competitividade Económica em Portugal: Uma Análise Estratégica" que convido o leitor, com veemência, a ler com a devida atenção.
Engº Luís Mira Amaral

As eólicas e o monstro elétrico

As centrais eólicas têm um problema: a intermitência do vento. Qualquer pessoa percebe que se o vento só sopra 25% do tempo, não é possível abastecer o nosso país só com eólicas! E sendo máquinas de capital intensivo que só trabalham 25% do tempo, qualquer empresário iria à falência se trabalhasse nessas condições...

Engº Mira Amaral
Uma rede elétrica, mesmo sem estas tecnologias intermitentes, tem sempre alguma geração de reserva para suprir a falha de geradores em serviço. Por isso, até 2000 Mw de eólica instalada, o nosso sistema acomodava essa capacidade através da reserva excedentária existente e da capacidade de armazenagem nas albufeiras.

Mas, com a capacidade instalada a chegar aos 4630 Mw, é preciso novas barragens para acumular a energia em excesso produzida durante a noite e centrais térmicas em regime de subutilização durante o dia só para suprirem a falta de vento. Como as térmicas têm que estar sempre preaquecidas para entrarem imediatamente em serviço quando não há vento, isso implica gasto de combustível para esse preaquecimento sem estarem a produzir eletricidade. E ainda temos o desgaste do material no para-arranca...

Então, quanto mais eólica instalada, mais energia em excesso durante a noite a necessitar de mais bombagem e mais térmicas de dia subutilizadas a funcionarem como back-up das eólicas, ou seja, brutais custos fixos dessas centrais.

Mexia diz, e bem, que nos custos da eletricidade cinquenta por cento são custos de capital, mas foi ele o orientador da criação do monstro elétrico...

domingo, 9 de março de 2014

Citação do dia (156)

"É provável que o maior mito relativo aos mercados advenha da sua própria denominação. Temos tendência a pensar num mercado como se de uma coisa se tratasse quando, de facto, respeita às pessoas que se envolvem em transacções económicas nos termos e modalidades em que mutuamente acordam. Neste sentido, é possível contrastar um mercado com o planeamento central ou a regulação governamental. Com demasiada frequência, todavia, quando um mercado é percepcionado como sendo uma coisa, é considerado como um mecanismo impessoal, quando na realidade é tão pessoal quanto as pessoas que nele participam. Esta concepção errónea permite que terceiros procurem retirar a liberdade às pessoas para transaccionar entre si nos termos que mutuamente acordarem, e apresentar essa restrição à sua liberdade como se tratasse de resgatar as pessoas dos "ditames" do mercado impessoal, quando, na verdade, isso corresponderia a submetê-las aos ditames de terceiros."

sexta-feira, 7 de março de 2014

FMI, Rússia e SDR´s

Já assinalámos (aqui e aqui) que, pelo menos desde 2009 se têm levado a cabo iniciativas de reformulação profunda do sistema monetário e financeiro mundial. Seja por iniciativa dos BRICS no seu conjunto ou algum dos seus agentes isoladamente (a China e a Rússia, claramente). Até alguns dos países emergentes, agora que sofrem com os "apertos da mangueira" monetária americana, buscam avidamente um novo enquadramento para as suas necessidades de financiamento ou de comércio.
O que agora acontece na Ucrânia é mais uma chama num incêndio existente, não duvidemos. Basta ter presentes as ameaças russas face à hipótese de sanções por parte dos EUA ou da UE. Veja-se neste artigo da Reuters onde já vai o Novo Grande Jogo. São inegáveis os sinais e mesmo no seio da administração americana se intensificam pressões para implementar reformas relativas à composição do Fundo Monetário Internacional (aqui). A pretexto de "acidentes" como o que se desenrola na Ucrânia, muita da paisagem financeira mundial pode registar mudanças substanciais.
Perguntava-me recentemente por que razão buscam os asiáticos tanto metal. Será que uma reorganização monetária promovida pelo FMI em torno de SDR´s poderá ser a razão?

A arte de mal governar e escapar com impunidade

consiste na dissociação temporal entre as acções cometidas e as respectivas consequências.

Por Gary Varvel

Juiz Napolitano: O monstro Putin

De há muito que o Andrew Napolitano é uma presença assídua neste blogue quer através de clips do saudoso programa televisivo da Fox, Freedom Watch, quer pelos seus artigos e livros que publica regularmente. Antigo juiz do equivalente a um tribunal da Relação, fervoroso defensor do espírito e letra da Constituição americana e dos Pais Fundadores, Napolitano faz valer as suas qualidades de jurisconsulto na veemente defesa da Liberdade. Rigoroso e eloquente, mas sempre didáctico, Napolitano explica no artigo que se segue (minha tradução) porque não devem os EUA imiscuir-se num conflito onde nada têm a defender que lhes seja, sequer remotamente, vital ainda que o comportamento imperial do governo do ex-KGB seja, como é, abjecto. Para o efeito, irá também convocar o 6º presidente dos EUA, John Quincy Adams. Tomara que Woodrow Wilson tivesse seguido os conselhos que aquele proferiu ao invés de ter adoptado a "progressiva" e catastrófica doutrina segundo a qual os EUA têm a missão (divina?) de "tornar o mundo seguro para a democracia". As centenas de milhões de mortos que ocorreram no século XX têm aí a sua raiz. Por essa razão, importa retomar em breve a série de posts relativos à mãe de todas as catástrofes a que o século passado assistiu. O que faremos nos próximos dias.
6 de Março de 2014
Por Andrew P. Napolitano

O monstro Putin (Monster Putin)

O que sucede quando o governo dos Estados Unidos participa, de modo significativo, no derrube de governos estrangeiros em nome da difusão da democracia? Esse comportamento resulta geralmente em consequências não-intencionais e, com frequência, resulta em desastres.

Andrew P. Napolitano
Quando os Estados Unidos invadiram o Iraque em 2003, inicialmente para procurar armas de destruição maciça que, sabemo-lo agora, o governo Bush sabia não existirem, e promover a mudança de regime, os EUA conseguiram mudar profundamente a governação iraquiana. Mas, nesse processo, perdemos a vida de 4,500 soldados norte-americanos, sofremos 45 mil feridos, pedimos emprestados e gastámos - e não pagámos - mais de 2 milhões de milhões de dólares, causando a morte a 650 mil iraquianos e o desalojamento a 2,5 milhões, e abrimos o caminho no Iraque ao nosso inimigo público - a Al-Qaeda. A Al-Qaeda não estava no Iraque antes da nossa invasão. Hoje, ela controla um terço do país tornado instável.

Em 2010, o presidente Barack Obama decidiu que já não gostava do ditador favorito da América no Médio Oriente, o presidente Hosni Mubarak do Egipto, muito embora ele e os seus quatro antecessores imediatos tenha dado ao governo Mubarak, anualmente, cerca de 4 mil milhões de dólares. Foi assim que os nossos agentes fomentaram a revolução nas ruas, enquanto Obama sugeria abertamente que chegara a hora de Mubarak deixar o poder. Em seguida, as ansiadas e prometidas eleições livres tiveram lugar, e o inimigo declarado do Ocidente e um islâmico fanático, Mohammed Morsi, tornou-se no primeiro presidente eleito pelo povo na história do Egipto. Depois, os EUA decidiram que não o queriam na cadeira do poder independentemente da legalidade e da legitimidade moral da sua eleição, levando assim a administração Obama a incentivar um golpe militar.

quinta-feira, 6 de março de 2014

Metais preciosos em perspectiva – o ano de 2013

China 2/01/2014
À medida que vão sendo consolidados os números relativos ao mercado dos metais preciosos para o ano de 2013, eles não podem deixar de surpreender mesmo aqueles que seguem o mercado e as suas dinâmicas. As imagens que se seleccionaram para acompanhar este artigo (cortesia de Koos Jansen) demonstram bem a avidez com que se procura comprar metais preciosos na China. Dir-me-ão que se aproximava o ano do cavalo, mas isso não explica a continuidade de todo o fenómeno e dinâmica que o mercado revela. Já noutro artigo se apontou para os valores relativos à importação de ouro por parte da China (aqui) que quase corresponderam à totalidade da produção mundial.

quarta-feira, 5 de março de 2014

Que não se dê atenção ao partido da guerra

Tal como sucedeu aqui, a vertigem dos acontecimentos (reais ou veículos de mera desinformação) é de tal ordem que o risco da incorrecção (parcial) do relato é significativo. É o que tornou a acontecer agora com o artigo de Pat Buchanan, ontem publicado, que escolhi divulgar, em versão por mim traduzida.

Mas o meu interesse nesta matéria não é o da crónica de uma eventual guerra a propósito da Ucrânia. É, antes, o de convidar a reflectir sobre uma realidade que é bem mais complexa do que o maniqueísmo habitual propalado pelos políticos e media ocidentais - aqueles a que estamos directamente sujeitos - pretendem fazer passar ao grande público. A esta luz, o artigo de Buchanan, como é de resto habitual no seu autor, convida à análise serena e lúcida e, recorda algumas referências históricas e geográficas que, ainda que elementares, são fundamentais para a interpretação do que se vem passando. Sobretudo, que haja muito cuidado na aceitação acrítica das acusações de violação do "direito internacional" quando elas são esgrimidas por parte de quem age com o estatuto de império incontestado: "We're an empire now, and when we act, we create our own reality. And while you're studying that reality—judiciously, as you will—we'll act again, creating other new realities, which you can study too, and that's how things will sort out. We're history's actors ... and you, all of you, will be left to just study what we do". Ainda anteontem morreram mais 97 pessoas no Iraque.

Ainda que naturalmente dirigido ao público norte-americano, é aos cidadãos dos países europeus que ele mais interessará. Afinal de contas, o epicentro das duas guerras mundiais aconteceu aqui no Velho Continente.

ACTUALIZAÇÃO: mais uma "pequena surpresa" (transcrição parcial aqui) a juntar a esta outra.
Por Patrick J. Buchanan
4 de Março de 2014

Que não se dê atenção ao partido da guerra! (Tune Out the War Party!)

A decisão de Vladimir Putin de enviar tropas russas para a Crimeia, pôs os nossos belicosos falcões a respirar fogo. A russofobia está desvairada e os artigos de opinião fervem de indignação.

Barack Obama deveria abstrair-se de tudo isto e reflectir sobre o modo como os presidentes ao longo da Guerra Fria lidaram com Moscovo a propósito de confrontos muito mais graves.

Patrick J. Buchanan
Quando as divisões de tanques do Exército Vermelho esmagaram os combatentes húngaros da liberdade em 1956, matando 50 mil deles, Eisenhower não levantou um dedo. Quando Khrushchev construiu o Muro de Berlim, JFK foi a Berlim e proferiu um discurso.

Quando as tropas do Pacto de Varsóvia esmagaram a Primavera de Praga em 1968, LBJ não fez nada. Quando Moscovo ordenou ao general Wojciech Jaruzelski que esmagasse o Solidariedade, Ronald Reagan recusou-se a colocar Varsóvia numa situação de isolamento.

Estes presidentes não viram nenhum interesse vital dos EUA ameaçado nessas acções soviéticas, por brutais que tivessem sido. Sentiram que o tempo estava do nosso lado durante a Guerra Fria. E a história veio a dar-lhes razão.

segunda-feira, 3 de março de 2014

Importa-se de repetir?

Identificar a natureza dinâmica do presente não é original. Recentemente sublinhei a velocidade a que ocorrem factos relevantes no mundo de hoje, cuja relação, por não ser evidente, negligenciamos. Ou não têm expressão nos veículos da verdade oficializada. Muito do que está a acontecer em torno da Ucrânia comporta consequências que não estão ainda bem medidas ou antecipadas. Não obstante, o presente tem facetas complementares, cuja relevância não pode ser negada. Seja pela sua eventual concretização ou, não se concretizando, pelo que sinalizam relativamente ao que é possível que venha acontecer. Que o cidadão comum terá conhecimento apenas como facto consumado.
Repare: e se, de repente, um economista popular - um prémio nobel da economia - lhe dissesse que seria melhor para todos os europeus (especialmente os do sul…) se a Alemanha abandonasse o projecto da moeda única? Agora. Ao mesmo tempo que os líderes (nacionais ou europeus) nos dizem que a crise está ultrapassada, que o futuro é brilhante.
Importa-se de repetir?




O vídeo foi editado a partir da Palestra "The Future of Europe" de Josef E. Stiglitz em Janeiro deste ano, em particular no momento de perguntas e respostas.

sábado, 1 de março de 2014

Fim à austeridade?

Os leitores habituais do Espectador Interessado ter-se-ão dado conta do progressivo afastamento do ruído do dia-a-dia, próprio do "combate de blogues", para privilegiar um olhar mais sereno embora nem por isso menos incisivo e, quiçá, até mesmo mais "radical" sobre os temas que são alvo da atenção dos seus autores.

De facto, usando para aferição o número de posts (não) publicados, temos estado muito alheados dos "debates" (?) sobre uma suposta "espiral recessiva" e uma não menos suposta "recuperação redentora" (que, num momento de arrebatamento,  chegou mesmo a ser apelidada de "milagre") decorrente da acção patriótica do governo de turno. Do mesmo modo, o interesse que manifestámos em exercícios de exegese económica ao ritmo da divulgação das mais variadas estatísticas, tem sido bastante diminuto. E não apenas porque, parafraseando Ronald Coase, os dados estatísticos, se sujeitos a suficiente tortura, acabarão por confessar tudo (e um par de botas). Por aqui, preferimos cingirmo-nos à aritmética elementar aliada ao bom senso. E, aqui chegados, é fácil concluir, à semelhança aliás do verificado nas situações de pré-bancarrota de 1978-1979 e de 1983-1985, que o "ajustamento" da economia portuguesa foi conseguido quase integralmente à custa do sector privado da economia, continuando o Estado estruturalmente tão rotundo quanto o era em Abril de 2011. Sem receitas extraordinárias, o défice do orçamento continuaria acima dos 5% do PIB e isto depois de uma punção fiscal de que não há memória, nem plano (ou vontade) para a aliviar.

É então a austeridade inevitável? A resposta a esta pergunta depende do que entendamos por "austeridade". Constituirá "austeridade" ter um défice orçamental superior a 5% do PIB? Constituirá austeridade a situação de "risco" de inclusão nas contas públicas de outras rubricas que sempre lá deveriam ter estado? Há uns meses atrás, João Cortez proporcionou-nos uma boa tradução de um excelente texto de Franz Hollenbeck intitulado "As três formas de austeridade" que aconselharia agora a (re)ler. Na 5ª feira, dia 27 de Fevereiro, Mark Thornton, a propósito da nova proposta de orçamento de Obama onde este proclama a necessidade de pôr "fim à austeridade", volta ao tema que continua a ser alvo de basta mistificação. A "actualidade estrutural" do texto de Thornton compeliu-me a traduzi-lo. (Todos os erros que possam decorrer da tradução são da minha responsabilidade, bem assim como das notas introduzidas.)
O presidente Barack Obama divulgou recentemente a sua proposta de orçamento na qual apela ao "fim da austeridade". Esta é uma declaração surpreendente por parte de um presidente sob cuja administração a despesa pública federal atingiu a maior percentagem de sempre no PIB e em que a dívida pública aumentou mais do que no conjunto de todos os presidentes que o precederam. O que entenderá ele por austeridade?

Mark Thornton
Há manifestações pelo mundo fora contra a austeridade quase todos os dias. Ela é condenada por constituir um veneno em tempos económicos difíceis, enquanto outros a tomam pelo elixir contra as depressões económicas.

A rejeição da austeridade pelo presidente representa a visão keynesiana, que rejeita completamente a austeridade em favor da abordagem às recessões conhecida por "pedir emprestado e gastar" - a de fazer crescer a procura agregada. O que ele na realidade está a rejeitar são as reduções infinitesimais na taxa de crescimento da despesa e os obstáculos políticos a novos programas de despesa.

Embora os níveis de despesa nos orçamentos entre 2009 e 2012 tenham permanecido relativamente constantes, eles foram ainda assim 15% superiores ao de 2008 e 75% mais elevados que os verificados na década anterior. Este salto na despesa nestes quatro anos foi financiado com um aumento de 5 milhões de milhões de dólares da dívida pública. Austeridade, aqui? Nenhuma!