sábado, 7 de julho de 2012

Uma síndrome perigosa

Patrick J. Buchanan assina Iran Derangement Syndrome. Eu tento, mais uma vez, uma tradução que cumpra os mínimos. Querendo o leitor ajuizar da qualidade dessa tentativa, aceite também a referência ao artigo de Philip Giraldi (ex-quadro da CIA), igualmente na American Conservative, intitulado Iran Guilty, Facts Be Damned.
"O Irão não pretende ter a bomba atómica, cuja posse é inútil e perigosa e constitui um grande pecado do ponto de vista intelectual e religioso."

Foi desta forma que o líder supremo Ayatollah Ali Khamenei declarou em Fevereiro que a posse por parte do Irão de armas atómicas seria um pecado mortal contra Alá.

É também unânime a opinião da comunidade dos serviços de informações dos EUA, declarada em 2007 e afirmada em 2011, que o Irão abandonou quaisquer programas para construir armas nucleares.

Estará o Ayatollah mentindo? Estará todo o conjunto dos serviços de intelligence dos  EUA errado?

As instalações do Irão, em Natanz, onde o urânio é enriquecido a 5 por cento, e em Fordow, onde é enriquecido a 20 por cento - em ambos os casos abaixo do limiar necessário para a construção de armas - estão sob controlo constante das Nações Unidas. O Irão ofereceu-se para entregar o seu urânio enriquecido a 20 por cento e a parar o enriquecimento a esse nível, se o Ocidente fornecer isótopos para a sua medicina nuclear e levantar algumas das sanções mais gravosas.

No deal, afirmam os Estados Unidos. O Irão deve renunciar, completamente, ao enriquecimento e por tempo indefinido.

Este é o ponto problemático nas negociações. O Irão alega que, como signatário do Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares, tem o direito de enriquecer urânio para fins pacíficos. Neste aspecto, o povo iraniano apoia o seu governo.

Poderá este impasse ser motivo para uma guerra?


Suponhamos que o Irão tenha desviado combustível nuclear para alguma instalação secreta para o enriquecer com a finalidade de construir uma arma. O processo levaria meses, senão anos. O Irão teria, então, de construir e testar um dispositivo explosivo que o mundo iria conhecer numa questão de horas. O Irão teria, ainda, de armar o dispositivo.

Todo o processo levaria mais de um ano, talvez vários. Ficaríamos a sabê-lo e a ter tempo para exercer uma opção militar muito antes que tal acontecesse.

Os israelitas, com centenas de armas nucleares, teriam provavelmente dado conta disso antes de nós. E, temendo mais o Irão, não hesitariam em usar o que têm para evitar uma bomba atómica em Teerão.

A réplica é conhecida: o Presidente Mahmoud Ahmadinejad é um fanático certificado que ameaçou varrer Israel do mapa. Ele não pode ser autorizado a chegar perto de uma arma nuclear.

No entanto, o que quer que seja que Ahmadinejad tenha afirmado anos atrás, e que permanece em disputa, ele não controla os militares, ele não decide sobre a guerra, e vai deixar a presidência em Julho próximo voltando à academia.

Tem a América medo de Mahmoud Ahmadinejad?

Onde está, então, a ameaça mortal para justificar os preparativos dos EUA para a guerra com o Irão descritos na imprensa nacional esta semana?

Gideon Rachman, no Financial Times, sustenta que a nossa obsessão com o Irão está obscurecendo uma ameaça potencial muito maior.

O Paquistão possui, talvez, 100 bombas nucleares e está construindo mais, e o seu  anti-americanismo é muito mais exuberante que o do Irão. Escreve Rachman:

"O Paquistão forneceu tecnologia nuclear à Coreia do Norte, à Líbia e ao próprio Irão. O país chegou perigosamente perto de um conflito nuclear com a Índia em 1999. Quanto ao terrorismo, Osama bin Laden estava vivendo em solo paquistanês há já muitos anos, e as áreas tribais do Paquistão são ainda a mais importante das bases da Al-Qaeda.

"O Paquistão também foi a rampa de lançamento para os ataques terroristas em Bombaim em 2008, nos quais 164 pessoas foram mortas. Embora o governo do Paquistão tenha condenado os ataques, há fortes indícios de que os terroristas tinham ligações com os serviços secretos paquistaneses. Se os ataques de Bombaim tivessem sido lançados a partir do Irão, o Ocidente estaria ainda hoje bramindo contra o "terrorismo patrocinado pelos Estados."

Sete em cada 10 paquistaneses consideram a América como um inimigo. E os ataques através de drones, muito incrementados pelo presidente Obama, que ceifaram a vida a muitos paquistaneses inocentes, aumentaram essa animosidade.

No entanto, aviões e navios de guerra norte-americanos estão dirigindo-se para o Golfo Pérsico, enquanto 44 senadores americanos exortaram o presidente a interromper as conversações com Teerão, a endurecer ainda mais as sanções e a preparação para a guerra.

Enquanto isso, o Irão está testando mísseis que podem atingir Israel e bases norte-americanas, e a sua grande frota de barcos de mísseis está em exercícios no Golfo.

Otto von Bismarck disse que a guerra preventiva era como cometer suicídio por causa do medo da morte. Estamos já nós, americanos, em direcção a mais uma guerra desnecessária?

Em 1959, o presidente Eisenhower convidou Nikita Khrushchev, o Carniceiro de Budapeste, para os Estados Unidos pora 10 dias de turismo e conversações. Em 1972, Richard Nixon viajou para Pequim para brindar e falar com o Presidente Mao, que era responsável pelas mortes de dezenas de milhões de chineses e dezenas de milhares de norte-americanos na Coreia.

Ronald Reagan buscou constantemente uma oportunidade para se sentar em frente dos governantes do "Império do Mal".

O Irão não pertence, sequer remotamente, a essa Liga, tanto nos crimes atribuídos ao regime como quanto a constituir qualquer ameaça, real ou potencial, aos Estados Unidos.

Não teremos nós estadistas que possam sentar-se, como Reagan em Reykjavik, e negociar com os líderes iranianos garantias verificáveis de que o Irão não se está movimentando para obter armas nucleares em troca de algo que se aproxime de relações normais?

Se pudémos sentarmo-nos com Stalin e Mao, por que razão o Ayatollah ou Ahmadinejad estarão para além dos limites? Será que não podemos lidar apenas com isso?

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