quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Confiança e Legitimidade

Ladar Levison
Nos dias que correm, uma interpretação que desafie a versão normalizada dos factos é muitas vezes tratada como conspirativa. Procurar uma visão mais alargada e profunda dos acontecimentos é tarefa que, pelos vistos, apenas um punhado de indivíduos, com propósitos decadentes ou condenáveis, deseja alcançar. Sejamos honestos, esses propósitos existem e estão ao alcance de qualquer frequentador da internet. Deve o receio de ser apelidado de conspirativo traduzir-se na desistência de procurar, individualmente ou em grupo, coligir e compreender o máximo de informação factual relevante? Esse receio pode ser tão forte que nos faça desistir de dar enquadramento crítico ao que, numa velocidade cada vez maior, acontece por esse mundo fora? Disputando a versão oficializada? Devem os indivíduos abdicar de fazer perguntas? Devem os indivíduos desistir de lembrar que a Liberdade não se compatibiliza com a intromissão, com a ameaça (velada ou directa), com a violência, com o roubo?

Consideremos a seguinte intervenção de Ladar Levison. Se as perguntas acima elencadas lhe parecerem ser meros artifícios retóricos, volte a considerá-las depois de ouvir Ladar Levison.

Para enquadrar a intervenção de Levison, basta dizer que é um empresário que se encontra em litígio legal com o estado e a sua máquina de poder. No seguimento de uma política de intimidação e (suposta) prevenção anti-terrorista, foi requerido à sua empresa que permitisse o acesso aos dados dos seus clientes e que possibilitasse o controlo de algumas dimensões do seu negócio por parte das autoridades federais. Tudo em nome da luta contra o terrorismo, sublinhe-se. E, não esqueçamos, da liberdade. Levison decidiu fechar o seu negócio, pois tinha em alta estima os seus clientes, a sua privacidade e, presume-se, também a liberdade. Ouçamos a sua intervenção:


Em conclusão são várias as implicações deste caso (que ainda vai no início):

- está ferida a legitimidade do estado na sua acção reguladora – da administração, às forças de segurança ou aos tribunais -, pois em função de uma determinação política se violam os mais elementares valores que era suposto defender (aqui ainda me dirijo aos crentes);
- a confiança não tem lugar entre as pessoas (e as pessoas e as instituições) quando, nestas circunstâncias políticas com profundo alcance económico, são promovidas a suspeição e o medo generalizado por parte de um agente tão poderoso e (infelizmente) determinante como é o estado;
- por fim, considerem-se que consequências este caso (e outros semelhantes - Apple, Google por exemplo) terá nas relações entre países e economias; ou as reacções que ele suscita aos restantes agentes económicos e políticos do novo grande jogo.

Não é um problema específico dos EUA. Todos usamos, uns mais intensamente do que outros, a parafernália tecnológica que auxilia a vida nos dias de hoje e o poder das máquinas do estado não conhece fronteiras. Nem mesmo o regresso “às máquinas de escrever” garante a confiança, basta lembrar a história. O problema permanece sob diferentes formulações, abordemos uma: será legítimo que o estado, em surdina e conseguindo o apoio (convicto ou exigido) de algumas empresas, exerça o seu poder sem limites?

O leitor, por receio de ser acusado de conspirador, já desistiu de fazer perguntas?

8 comentários:

Luis Moreira disse...

Se deixarmos o estado não tem limites. Não se autolimitará nos seus poderes. Bom texto.

Unknown disse...

Simplesmente aterrador!

floribundus disse...

meu filho diz sou anarca por não gostar do estado.

no meu cv
'mais de 60 anos de luta inglória contra o MONSTRO'

temos ditaduras de partidos e de indivíduos do politicamente correcto

como contribuinte estive sempre ao serviço do estado

SAC disse...

Estimado LV,

Este texto não me trás preocupações novas, infelizmente reforça todas as que já tenho.
Quando penso que já tudo está regulado, há sempre mais "malha para apertar"...

Acabo de ler um estudo do International Monetary Fund o qual deixo o link para o caso de entender dar alguma atenção.

http://www.imf.org/external/pubs/ft/sdn/2014/sdn1402.pdf

O capítulo dedicado às conclusões são uma súmula por si só suficientemente arrepiantes.

Ser financeiramente abastado não deve ser motivo de perseguição, o modo como se chegou a essa situação eventualmente sê-lo-á, dai que não entenda este estudo e muito menos as suas conclusões.

LV disse...

Aos leitores remeto um agradecimento pela leitura crítica que fazem dos artigos publicados. O importante é começarmos a criar a distância e o cepticismo suficiente para sobreviver (como escrevia Eduardo Freitas) à "barragem de propaganda e manipulação". Ela faz-se sentir em todas as dimensões da nossa vida individual - como bem mostrou a intervenção de Levison. É, efectivamente, aterrador. Mas o primeiro ponto é termos consciência disso, discutirmos abertamente este Mal e agirmos de modo consequente. O que decorre desse mal afecta tudo e todos - da vida aos valores que a estruturam, da paz à prosperidade.
Mantenhamos a teimosia de lembrar a importância da Liberdade.
Saudações,
LV

LV disse...

Caro SAC,
Só agora pude seguir a ligação que me indicou no seu comentário. Que agradeço.
Aviso: li, apenas, a primeira página. E já me parece familiar, muito familiar a narrativa. Logo no primeiro parágrafo temos a seguinte frase (traduzo rapidamente): "Os economistas estão a focar a sua atenção nas relações entre a desigualdade crescente e a fragilidade do crescimento. A narrativa explicativa envolve a desigualdade, a dívida e os ciclos financeiros como origens da crise; bem como os factores de política económica (especialmente pelos ricos) ao permitir que os excessos financeiros crescessem até à crise."
Sem prejuízo da leitura atenta que o documento exige, parece-me que a atenção é desfocada do essencial (os efeitos de distorção que as políticas de voluntarismo monetário e regulatório das instituições estatais - que serão um dos pólos de uma relação promíscua com interesses corporativos) para se focar em problemas de natureza social (e até moral) que conduzem à desigualdade e, pelos vistos, à ausência de produção de riqueza e crescimento económico.
Estarei a colocar bem o problema, SAC?
Saudações,
LV

SAC disse...

LV,
De facto parece-me que a leitura a fazer é essa. Diria mesmo, e fazendo uma leitura mais extensiva da questão, que o que está por trás deste estudo: REDISTRIBUIÇÃO/DESIGUALDADE/CRESCIMENTO, é uma cada vez maior interveção dum estado paternalista, leia-se SOCIALISTA...

Termino chamando a sua atenção para um parágrafo nebuloso extraído do capitulo das conclusões, ora veja:

"On average, across countries and over time, the things that governments have typically done to
redistribute do not seem to have led to bad growth outcomes..."

O estado só me deu a maioridade para que eu decida alguns aspecto da minha vida, os outros "ele" faz o favor de me isentar de tamanho incomodo...
Cumprimentos

LV disse...

Caro SAC,
Excelente parágrafo final do seu último comentário.

Enquanto pude seguir na leitura do documento fui seleccionando algumas passagens que são espelhos da aparelhagem ideológica que guia estes estudos e instituições. Vejam-se algumas dessas passagens:
- "We should not jump to the conclusion that a treatment for inequality—redistribution—may be worse for growth than the disease itself."(p.5)
- "Third, redistribution appears generally benign in its impact on growth; only in extreme cases is there some evidence that it may have direct negative effects on growth."(p.7)
- " It would still be a mistake to focus on growth and let inequality take care of itself, not only because inequality may be ethically undesirable but also because the resulting growth may be low and unsustainable."(p.25)
Desigualdade eticamente indesejável? Mas de que desigualdade é que se está a falar? (pergunta retórica…) Condenável é a igualdade para lá da que decorre da dignidade moral da pessoa, do indivíduo. Enquanto seres humanos possuímos uma dignidade moral semelhante (e do que decorre dela), mas para além disso estaremos, isso sim, no domínio do "eticamente condenável". Mas os autores não estão para discutir pressupostos, escrevem apenas para reforçar uma visão desgastada: socialismo (SAC disse-o muito bem!).

Depois de 26 páginas de keynesianismo recupero a passagem:
- "Against these results, it must be borne in mind that the data are particularly scarce and unreliable for redistribution, even more so than for inequality.(p.7)

Estudos para quê, afinal?
Só se for para reforço condicionante. E não será pequeno o impacto, lá isso não.
Saudações,
LV