terça-feira, 17 de março de 2015

Quando já não se acredita nas suas próprias mentiras

Por razões que o comum dos americanos não merece conhecer, Barack Obama decidiu há dias anunciar (mais) uma situação de "emergência nacional". Trata-se agora do "extraordinário risco" que a situação política na Venezuela colocaria à segurança dos EUA. Como seria de esperar, Nicolás Maduro não enjeitou a ocasião para tornar a imputar aos inimigos externos a culpa pelas enormes dificuldades por que passa o país que desgraçadamente (des)governa - Maduro, com o petróleo venezuelano, fez jus a Friedman quanto este afirmava que caso se entregasse a gestão do deserto do Sahara ao governo federal, em cinco anos sobreviria uma escassez de areia...

Perante um pedido de comentário à reacção de Maduro às novas sanções impostas por Obama no decorrer de uma conferência de imprensa no passado dia 11, a porta-voz da secretaria de Estado, Jen Psaki, lendo uma declaração pré-preparada sobre o tema, refere a certa altura sem se rir:
«No que constitui uma política de longa data, os Estados Unidos não apoiam transições políticas concretizadas por meios não constitucionais. As transições políticas devem ser constitucionais, democráticas, pacíficas e legais.»

O leitor que faça a sua própria avaliação e, nomeadamente, que atente na linguagem corporal da porta-voz perante a incredibilidade que tais declarações suscitaram na assistência:


Mike Krieger, que conta a história, assinala o curioso facto de a ele lhe parecer que, ao longo da sua vida, a política externa dos Estados Unidos não tem visado outra coisa que não seja a iniciação de transições políticas concretizadas por meios não constitucionais. Não vejo como não o acompanhar nessa observação, especialmente válida para a América Latina.

2 comentários:

Anónimo disse...

Se te referes ao Chile, foi a decisão mais inteligente e certeira que os EUA tomaram no sec XIX no que se refere à américa latina. Caso contrário teríamos hoje um Chile igual a uma Cuba e a uma Venezuela.

Eduardo Freitas disse...

Admitindo que o leitor Anónimo faz parte do círculo de pessoas que naturalmente se me dirige na segunda pessoa do singular - única razão que me leva a responder-lhe -, cabe fazer notar que o post se limita a explicitar uma tão gigantesca mentira que nem sequer quem a veicula nela acredita. Esse é o único juízo de valor que o post veicula.

Desde pelo menos 1893, com o derrube da monarquia autóctone no Hawai, que os Estados Unidos não têm feito outra coisa que não seja promover mudanças de regime. No processo, as questões constitucionais não chegaram (nem chegam) sequer ao estatuto da minudência.

O artigo da Wikipédia, em inglês, é uma boa fonte para documentar a actividade dos EUA neste domínio a partir dos inícios da segunda metade do século XX.

Eduardo Freitas