quinta-feira, 16 de abril de 2015

Lincoln - culto e mentira

Em consequência do atentado a tiro perpetrado por John Wilkes Booth na véspera, Abraham Lincoln faleceria em 15 de Abril de 1865, há precisamente 150 anos. Persistem, até aos nossos dias, fundadas dúvidas quanto à "narrativa" da versão oficial do que na altura sucedeu: acção de um lobo solitário ou produto de uma conspiração? Uma pergunta recorrente nos EUA ao longo dos anos, pergunta a que o establishment americano sempre imprimiu um sentido de urgência na adopção da primeira hipótese e em descartar a segunda (um outro aspecto do excepcionalismo americano como defenderia Allen Dulles poucos meses após o assassínio de JFK). Em qualquer caso, ao observar com atenção a fotografia do Lincoln Memorial (Memorial a Lincoln), perceber-se-á


onde os "historiadores da corte" colocaram Lincoln - num Olimpo onde só há lugar para um deus que ele incarnou em vida.

Mas, também aqui, são cada vez mais os académicos que desafiam o "monstro sagrado". Thomas DiLorenzo é um deles e, tal como faz Paul Craig Roberts no artigo que de seguida se propõe aos leitores, aconselho com veemência a leitura dos seus livros sobre Lincoln (para um vislumbre do seu conteúdo, leia-se o sumarento texto que hoje publicou no LRC). É que, como sabemos, as mentiras do passado são em boa medida sustentáculo das actuais. Na política como na economia.
13 de Abril de 2015
Por Paul Craig Roberts


É uma das ironias da história que o Lincoln Memorial seja um espaço sagrado para o Movimento dos Direitos Civis e o local onde Martin Luther King proferiu o discurso "Eu tenho um sonho".

Paul Craig Roberts
Lincoln não pensava que os negros fossem iguais aos brancos. O plano de Lincoln consistia em enviar os negros da América de volta para África. Não tivesse ele sido assassinado, essa teria sido provavelmente a sua política no pós-guerra.

Como Thomas DiLorenzo e um conjunto de historiadores não pertencentes à corte concludentemente estabeleceram, Lincoln não invadiu a Confederação para libertar os escravos. A Proclamação da Emancipação só ocorreu em 1863, quando a oposição no Norte à guerra estava em crescendo, apesar das medidas do estado policial de Lincoln para silenciar opositores e jornais. A Proclamação da Emancipação foi uma medida de guerra emitida ao abrigo dos poderes de guerra de Lincoln. A proclamação permitiu que os escravos emancipados fizessem parte das fileiras do exército da União para compensar as baixas sofridas. Também havia a expectativa de que o anúncio viesse a provocar revoltas entre os escravos do Sul, enquanto os homens brancos sulistas estavam longe na guerra, e assim retirar soldados das frentes de batalha para proteger as suas mulheres e crianças. A intenção era a de acelerar a derrota do Sul antes que a oposição política a Lincoln se fortalecesse no Norte.


O Lincoln Memorial foi construído não porque Lincoln "tenha libertado os escravos" mas porque Lincoln salvou o império. Como Salvador do Império, não tivesse Lincoln sido assassinado, poderia ter ascendido a imperador vitalício.

Como escreve o professor Thomas DiLorenzo: "Lincoln passou toda a sua carreira política a tentar usar os poderes do estado em benefício da elite corporativa endinheirada (os "um por cento" da época), primeiro no Illinois e depois, de forma generalizada no Norte, recorrendo a tarifas proteccionistas, subsidiação das empresas das estradas, canais e caminhos-de-ferro, e um banco nacional controlado por políticos como ele próprio para financiar tudo isto."

Lincoln era um homem do império. Logo que o Sul foi conquistado, devastado e saqueado, o seu friso de generais criminosos de guerra, como Sherman e Sheridan, virou-se para o extermínio dos Índios das Planícies, num dos piores actos de genocídio da história humana. Ainda hoje, os sionistas israelitas apontam para o extermínio, ditado por Washington, dos Índios das Planícies como modelo para o roubo da Palestina por Israel.

A Guerra de Agressão do Norte deu-se devido às tarifas e ao imperialismo económico nortenho. O Norte era proteccionista. O Sul era pelo livre comércio. O Norte pretendia financiar o seu desenvolvimento económico forçando o Sul a pagar preços mais caros pelos produtos manufacturados. O Norte fez aprovar a Pauta Morrill [pauta aduaneira - NT] que mais do que duplicou a tarifa média para 32,6% e previa a possibilidade de novos aumentos até 47%. As tarifas desviavam os lucros das exportações agrícolas do Sul para os cofres dos industriais e fabricantes do Norte. Ela foi concebida para redireccionar a despesa do Sul, em manufacturas provenientes de Inglaterra, para as produzidas no Norte a um custo mais elevado.

Esta a razão pela qual o Sul abandonou a União - um direito de auto-determinação, nos termos da Constituição.

O propósito da guerra de Lincoln era salvar o império, não abolir a escravatura. No seu primeiro discurso de tomada de posse, Lincoln "fez uma defesa férrea da escravatura". O seu propósito era manter o Sul no Império, apesar da Pauta Morrill. Quanto à escravatura, Lincoln afirmou: "Eu não tenho nenhuma intenção, directa ou indirecta, de interferir na instituição da escravatura nos Estados onde ela existe. Acredito que não tenho o direito de fazê-lo, e não sinto nenhuma inclinação para o fazer." Esta posição - recordou Lincoln à sua audiência - fazia parte da plataforma do Partido Republicano de 1860. Lincoln também emprestou o seu apoio à rigorosa fiscalização do cumprimento da Lei do Escravo Fugitivo, que exigia aos nortistas que perseguissem e "devolvessem" os escravos fugitivos, e deu o seu apoio à Emenda Corwin à Constituição, já aprovada pelos votos do Norte na Câmara e no Senado, que proibia qualquer interferência federal em matéria de escravatura. Para Lincoln e os seus aliados, o império era muito mais importante que os escravos.

O propósito da guerra de Lincoln era salvar o império, não abolir a escravatura. No seu primeiro discurso de tomada de posse, Lincoln "fez uma defesa férrea da escravatura". O seu propósito era manter o Sul no império, apesar da Pauta Morrill. Quanto à escravatura, Lincoln afirmou: "Eu não tenho nenhuma intenção, directa ou indirecta, de interferir na instituição da escravatura nos Estados onde ela existe. Acredito que não tenho direito de o fazer, e não sinto nenhuma inclinação para o fazer." Esta posição - recordou Lincoln à sua audiência - fazia parte da plataforma do Partido Republicano de 1860. Lincoln também emprestou o seu apoio à rigorosa fiscalização do cumprimento da Lei do Escravo Fugitivo, que exigia aos nortistas que perseguissem e "devolvessem" os escravos fugitivos, e deu o seu apoio à Emenda Corwin à Constituição, já aprovada pelos votos do Norte na Câmara e no Senado, que proibia qualquer interferência federal em matéria de escravatura. Para Lincoln e os seus aliados, o império era muito mais importante que os escravos.

DiLorenzo explica qual foi o acordo que Lincoln ofereceu ao Sul. Porém, assim como o império era mais importante para o Norte do que a escravatura, para o Sul, evitar os grandes impostos sobre os produtos manufacturados - na realidade, um imposto sobre os seus lucros agrícolas - era mais importante do que as garantias do Norte relativas à escravatura. Caso o leitor pretenda desalojar os efeitos da lavagem ao cérebro que lhe fizeram sobre a Guerra da Agressão do Norte, leia os livros de DiLorenzo, The Real Lincoln, e Lincoln Unmasked. A chamada Guerra Civil não foi uma guerra civil. Numa guerra civil, ambos os lados lutam pelo controlo do governo. O Sul não estava a lutar pelo controlo do governo federal. O Sul separou-se e o Norte recusou-se a deixar que o Sul seguisse o seu caminho.

Escrevo sobre este tema porque pretendo ilustrar como a história é falseada ao serviço de agendas. Sou totalmente a favor dos direitos civis e participei do movimento enquanto estudante universitário. O que me deixa desconfortável é a transformação de Lincoln, um tirano que foi um agente dos "um por cento" e estava disposto a tudo destruir em nome do império, num herói dos direitos civis. Quem virá a seguir? Hitler? Stalin? Mao? George W. Bush? Obama? John Yoo? Se Lincoln pode ser um herói dos direitos civis, também os torcionários o podem ser. Aqueles que matam mulheres e crianças nas guerras de Washington podem ser transformados em defensores dos direitos das mulheres e defensores das crianças. E, provavelmente, viram a sê-lo.

Este é o retorcido e perverso mundo em que vivemos. Vladimir Putin, presidente da Rússia, é confrontado com o derrube levado a cabo por Washington do governo eleito na Ucrânia, um aliado da Rússia e, durante séculos, inclusive uma parte da própria Rússia, enquanto Putin é falsamente acusado de invadir a Ucrânia. A China é acusada por Washington de violar os direitos humanos quando é Washington que mata mais civis no século XXI que todos os outros países juntos.

No Ocidente há mentiras monstruosas que permanecem por questionar. As mentiras são institucionalizadas nos livros de história, nos currículos dos cursos, em declarações políticas, movimentos e causas e na memória histórica.

A América irá ter grandes dificuldades para sobreviver às mentiras em que vive.

1 comentário:

JS disse...

Sim. Sem dúvida mais perto dos factos. Ainda hoje se fala em secessão aqui e acolá.

Curiosamente os Estados, nos EUA, teem hoje em dia mais autonomia (veja-se o Texas) governamental do que alguns dos ex-Estados da dita Un Europeia....