sábado, 1 de fevereiro de 2014

A Grande Guerra 1914-1918 – Algumas notas e fragmentos (II)

"Uma análise da história dos conflitos militares dos últimos dois séculos revela, claramente, que muitas guerras com efeitos devastadores para a humanidade poderiam ter sido prevenidas, ou seriam menos nocivas, não fosse a crescente influência dos estados na definição de políticas monetárias, em particular a sua influência e controlo da expansão do crédito e da criação de moeda. De facto, os governos têm escondido o verdadeiro custo destes conflitos dos seus cidadãos, usando procedimentos inflacionários para o seu financiamento. Que, ao abrigo da emergência militar, os tem deixado impunes. Por conseguinte, podemos afirmar com segurança que a inflação alimentou as guerras."

Jesús Huerta de Soto (2009), "Money, Bank Credit and Economic Cycles" (pp. 758, 759)

    Antes da 1ª Grande Guerra, vários países mantinham, sem grandes compromissos políticos ou conferências internacionais, o padrão-ouro, o que representava um travão aos ímpetos inflacionários dos governos. A saúde deste sistema assentava na compreensão e respeito de uma regra simples para a sua implementação eficaz (Ben Steil formulou de modo lapidar esta regra): se o ouro entra num país, então, procede-se à revisão em baixa das taxas de juro; caso o ouro saia, então, o procedimento inverso deve respeitar-se e devem elevar-se as taxas de juro. O respeito por esta regra simples impedia o agravamento de eventuais desequilíbrios globais, através da contenção da inflação (e dos preços). Recorde-se que, nos países que mantinham esta configuração inicial do padrão-ouro, se registava uma inflação muito próxima de zero.
     Mas porque haveria tal sistema deixar de funcionar? Como podemos entrever nas palavras de Huerta de Soto, os governos suspendem a paridade das suas moedas face ao ouro quando decidem entrar em conflitos militares. Alguns desses estadistas poderiam pensar (mas não dizer) que libertavam as suas moedas dos constrangimentos que o ouro sempre impõe, iniciando os “procedimentos inflacionários” para financiar essas campanhas. Foi, precisamente, o que aconteceu em 1914. Suspendeu-se o sistema padrão-ouro à entrada no conflito militar que haveria de ser o ponto de partida para mudanças políticas, económicas e sociais a uma escala geográfica e temporal jamais vista.
     Registou-se uma tentativa de regresso desse sistema nos anos 20, mas detectam-se imediatamente duas diferenças: em primeiro lugar, os países deixaram de respeitar aquela regra implícita que assinalámos atrás (os EUA e a França estavam a armazenar grandes quantidades de ouro, mas não estavam a baixar as taxas de juro); em segundo lugar, em 1925 os Ingleses retomaram a paridade com ouro que tinham antes de 1914, o que se traduziu numa sobrevalorização da libra (dada a inflação alcançada durante os anos do conflito), a uma deflação e recessão importantes. A degradação da economia provocou imensas tensões políticas e a Inglaterra foi obrigada a abandonar esse sistema em 1931. Tendo a Inglaterra um papel central nesse sistema, vários países o abandonaram igualmente.
    Poderia esta tentativa ter resultado? Teria sido possível caso a Inglaterra tivesse procedido à desvalorização da sua moeda. A França evitou o erro da Inglaterra, pois desvalorizou a sua moeda cerca de 80% desde a paridade pré-1914 e, estando a acumular bastante ouro, colocou uma pressão adicional sobre o Banco de Inglaterra que registava uma quebra nos stocks de ouro nos seus cofres. Por outro lado, os EUA estavam também a preparar-se para intensificar conflitos ao nível monetário e comercial, uma vez que tinham vindo a ser destino de muito do ouro que “fugiu” do continente europeu durante e depois da 1ª Grande Guerra.
    Concluímos este artigo pela recuperação das palavras de Philip Cortney na introdução à obra (que também traduziu) de Charles Rist, “The Triumph of Gold”, (p.43), chamando a atenção para o último parágrafo, que é escrito em 1961:

"Os dois principais obstáculos para o regresso a um padrão-ouro internacional são: (a) a oposição dos governos em colocarem um fim à inflação e a aceitação deste facto por parte dos cidadãos; e (b) a recusa dos EUA em considerar uma subida no preço do ouro em todas as moedas. Assim a alternativa ao regresso à sanidade monetária é mais inflação (...). Muitas pessoas acreditam que ainda temos escolha entre inflação e não-inflação. É minha convicção profunda de que a nossa escolha real é entre inflação ou liberdade. "

3 comentários:

Unknown disse...

dois pontos a merecer simpatia de parte do nosso bloco: a transparencia e escutinio é grande e os lideres alemaes alem de não gostarem de armasa inda gostam menos de inflação. Como cidadão sinto-me mais confiante.

LV disse...

@António Cristóvão
Relativamante à confiança que endereça às entidades europeias, peço-lhe que equacione o seguinte:
- o ECB já violou o seu mandato quando, não comprando dívida directamente aos países da União, compra depois a investidores que tomaram a iniciativa primeiro e mantém no seu balanço como um activo;
- lembra-se das declarações de Mario Draghi durante o Verão passado? Que o ECB faria o que fosse preciso para manter o euro? Nós não sabemos nem sonhamos o nível de mentira e dissimulação de que somos vítimas;
- há bancos, em todo o continente europeu (bancos alemães, italianos, holandeses…) que estão com desequilíbrios no balanço que nenhuma empresa , digamos normal, seria autorizada a operar;
- o governo italiano procedeu à limitação de participações accionistas entre bancos, resultado bancos que detinham participações maiores vão ter de vender para reduzirem essas participações… sabe quem vai comprar? O banco central italiano. Não parece um bail out?
Não esqueçamos que o Bundesbank referiu, há dias atrás, que os países em dificuldades (veja-se Portugal) deviam activar primeiro a um confisco de contas bancárias (à Chipre), antes de voltar a pedir novos pacotes de ajuda financeira internacional.
Confiante?
Saudações,
LV

Floribundus disse...

continuo a não perceber nada de teoria económica, apesar de ter lido os homens de Viena

sempre senti que as crises eram finançeiras e não dos sectores I e II

um dos pintores do séc XVI
tem uma bela gravura 'o peixe grande engole o pequeno'

os políticos sobrevivem mentindo

o rectângulo devia ser entregue a uma comissão administrativa (protectorado é feio) até conseguir pagar 1/2 da dívida neste século

há sectores socialistas de esquerda e direita que apostam na guerra