segunda-feira, 28 de julho de 2014

Pat Buchanan: Será Putin pior que Estaline?

O trágico derrube do avião civil no leste da Ucrânia no passado dia 17 desencadeou, nesse mesmo dia, o cortejo habitual de acusações indignadas e o brandir de novas ameaças de sanções por parte dos EUA/NATO para com a Rússia de Putin. O que volta a impressiona nos relatos dos media de "referência" é a sua absoluta disponibilidade para veicular o discurso da potência dominante (uma notável excepção aqui) sem que sequer tentem responder à pergunta essencial aquando de qualquer incidente que, sem muita dificuldade, pode desencadear tragédias subsequentes numa escala muitíssimo maior: Cui bono? Quem beneficia com o derrube do avião?

Talvez muitos já se tenham esquecido de umas certas "armas de destruição maciça" cuja existência constituía uma ameaça tão intolerável que "justificava" uma mortífera guerra no Iraque de que não se vê o fim, 11 anos decorridos. Havia provas, diziam, insofismáveis. Era mentira. Como mentira se revelou o cruzamento de uma certa "linha vermelha" pelo regime de Assad - as "provas" voltaram a ser insofismáveis - da utilização de gás sarin por parte do regime sírio. Novamente, cui bono?

É preciso parar de brincar com o fogo, actividade a que o transversal Partido da Guerra se dedica com afinco desmedido. E volta a ser da denúncia do Partido da Guerra, cuja sede principal se situa nos EUA, que trata este novo artigo de Pat Buchanan que pensei ser interessante partilhar com os leitores. A tradução é da minha responsabilidade bem como a adição de fotos, links e notas.
25 de Julho de 2014
Por Patrick J. Buchanan
Será Putin pior que Estaline?

Patrick J. Buchanan
Em 1933, o Holodomor decorria na Ucrânia.

Após os "kulaks", os agricultores independentes, terem sido liquidados na colectivização forçada da agricultura soviética, foi imposta à Ucrânia uma fome genocida através do confisco da sua produção de alimentos.

As estimativas dos mortos situam-se entre dois a nove milhões de almas.

Walter Duranty, do New York Times, que apelidou os relatos da fome de "propaganda maligna", ganhou um Pulitzer pela sua mendacidade.

Em Novembro de 1933, durante o Holodomor, o maior liberal [1] de sempre, FDR [o presidente Franklin Delano Roosevelt (1933-1945) - NT], convidou o ministro dos Negócios Estrangeiros Maxim Litvinov para receber o reconhecimento oficial dos EUA do regime assassino do seu senhor Estaline [2].

O genocida José Estaline
No dia 1 de Agosto de 1991, apenas quatro meses antes da própria Ucrânia ter declarado a sua independência, George H. W. Bush advertiu o poder legislativo em Kiev:
"Os americanos não apoiarão aqueles que buscam a independência com o propósito de substituir uma tirania distante por um despotismo local. Eles não irão ajudar aqueles que promovem um nacionalismo suicida baseado num ódio étnico."
Em suma, a independência da Ucrânia nunca fez parte da agenda da América. De 1933 a 1991, nunca constituiu um interesse vital dos EUA. Bush I opunha-se a essa independência.

Quando, pois, é que esta questão relativa à bandeira que flutua em Donetsk ou na Crimeia se tornou tão crucial que nos levasse a armar ucranianos para combater rebeldes apoiados pelos russos e a considerar dar uma garantia militar por parte da NATO a Kiev, potencialmente conduzindo-nos para uma guerra com uma Rússia dotada de armas nucleares?

Desde FDR que os presidentes dos EUA sentiram que a América não poderia permanecer isolada dos governantes da maior nação do mundo.

Nikita Khrushchev
Ike [o presidente Eisenhower (1953-1961) - NT] convidou Khrushchev para uma visita prolongada aos EUA depois deste ter afogado em sangue a Revolução Húngara. Depois de Khrushchev ter instalado mísseis em Cuba, em breve JFK [o presidente John Fitzgerald Kennedy (1961-1963)  - NT] apelou a um novo desanuviamento na Universidade Americana.

Semanas após os exércitos do Pacto de Varsóvia terem esmagado a Primavera de Praga em Agosto de 1968, LBJ [o presidente Lyndon Baines Johnson (1963-1969) - NT] procurou realizar uma cimeira com o primeiro-ministro Alexei Kossiguin.

Depois de ter impiedosamente denunciado Moscovo pelo derrube do KAL 007 em 1983, aquele velho combatente da guerra fria, Ronald Reagan, andou "à pesca" de uma cimeira.

O ponto: todos os presidentes de FDR a George H. W. Bush, mesmo após choques com Moscovo muito mais graves do que este embate sobre a Ucrânia, procuraram voltar a envolver os homens do Kremlin.

O que quer que pensássemos dos ditadores soviéticos que bloquearam Berlim, que escravizaram a Europa Oriental, que instalaram mísseis em Cuba e armaram árabes para atacar Israel, Ike, JFK, LBJ, Nixon, Ford, Carter, Reagan e Bush I, todos eles procuraram envolver os governantes russos.

Evitar uma guerra catastrófica exigia envolvimento.

Como se pode explicar então o clamor da elite da política externa dos EUA de hoje para enfrentar, isolar e paralisar a Rússia, e fazer de Putin um leproso moral e político com quem estadistas honrosos nunca poderão negociar?

Vladimir Putin
O que tem feito Putin para rivalizar com a fome forçada na Ucrânia que provocou milhões de mortos, o massacre dos rebeldes húngaros ou o esmagamento da Checoslováquia pelo Pacto de Varsóvia?

Na Ucrânia, Putin respondeu a um golpe de estado apoiado pelos EUA, que derrubou um aliado político da Rússia democraticamente eleito, com a tomada, sem derramamento de sangue, da Crimeia pró-Rússia onde Moscovo atraca a sua frota do Mar Negro desde o século XVIII. Isto é rotina geopolítica das grandes potências.

E apesar de Putin ter disposto um exército na fronteira da Ucrânia, ele não deu a ordem para invadir e ocupar Luhansk ou Donetsk. Será que isso se assemelha realmente a uma movimentação para recrear seja o Império Russo dos Romanov ou o império soviético de Estaline que chegava até ao Elba?

Quanto ao derrube do avião malaio, não foi Putin quem o ordenou. O senador John Cornyn afirma que os serviços de informações dos EUA ainda não forneceram nenhuma "arma fumegante" que ligue o disparo do míssil à Rússia.

Comunicações interceptadas pelos serviços de informações parecem indicar que os rebeldes ucranianos pensaram ter atingido um avião Antonov de transporte militar.

No entanto, hoje [25 de Julho - NT], a principal voz em matéria de política externa dos EUA do Partido Republicano, o senador John McCain, acusa a Casa Branca de Obama de "covardia" por esta não armar os ucranianos para combater os separatistas apoiados pelos russos.

Mas suponhamos que Putin respondia à chegada de armas americanas a Kiev ocupando o leste da Ucrânia. O que faríamos depois?

John Bolton tem a resposta: trazer a Ucrânia para a NATO.

Tradução: os EUA e a NATO devem entrar em guerra com a Rússia, se necessário, pela disputa sobre Luhansk, Donetsk e a Crimeia, embora nenhum presidente dos EUA jamais tenha pensado que a própria Ucrânia valesse uma guerra com a Rússia.

O que motiva Putin parece simples e compreensível. Ele quer o respeito devido a uma potência mundial. Ele vê-se como protector dos russos que foram deixados para trás no seu "exterior próximo". Ele aprecia fazer política das grandes potências. A história está cheia de homens destes.

Ele permite sobrevoos dos EUA para o Afeganistão, coopera no Grupo P5 +1 quanto ao Irão, ajudou-nos a eliminar as armas químicas da Síria, lança astronautas nossos em órbita, colabora na guerra contra o terrorismo e discorda acerca da Crimeia e da Síria.

Mas quais serão os motivos daqueles que do nosso lado procuram todas as oportunidades para reiniciar a Guerra Fria?

Não será um desejo desesperado para surgirem uma vez mais churchillianos, uma vez mais heróicos, uma vez mais relevantes, como se viram a si próprios durante a Guerra Fria que terminou há tanto tempo?

Quem é que aqui constitui o verdadeiro problema?
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Notas:

[1] - O termo surge aqui na acepção que se tornou predominante nos EUA durante o século XX. Equivale, no espaço político europeu continental, a "social-democrata" ou "socialista".
[2] - Na altura, Estaline observava: "A importação de cereais numa altura em que os estrangeiros estão a clamar pela sua escassez no interior da URSS, apenas faria deteriorar a nossa imagem política. Aconselho paralisar a importação de cereais. Pelo contrário, a cevada e a aveia devem ser exportadas, porque precisamos urgentemente de divisas."

5 comentários:

Anónimo disse...

Carissimo,

1) Estaline vs Putin. Nao se percebe a comparacao. FDR reconheceu a existencia do regime criminoso de Estaline. O regime criminoso de Putin é actualmente reconhecido pelos EUA. Nao há diferencas. A URSS foi combatida estrategicamente como inimiga. Putin coloca-se como um actor criminoso na cena internacional, deve tambem ser combatida como inimigo, nao só pelos EUA, mas principalmente pela Europa.
2) Independencia da Ucrania. Se os EUA näo encararam a independecia da Ucrania como interesse vital, entäo talvez nao devessem ter assinado o Memorando de Budapeste, onde se comprometeram a defende-la, em troca do desarmamento nuclear!
3) Relativamente as relacöes entre o Ocidente e a Russia, depois da guerra fria tentou integrar-se a Russia como um parceiro civilizado. Dado as ultimas accoes, esta claro que Putin se comporta como um imperialista ressabiado, tentando nao so invadir paises soberanos (onde tem apenas o apoio de uma minoria violenta), como tambem constrangir as liberdades em casa (o regime esta intimamente ligado a assassinato de jornalistas e perseguicao das oposicoes, para alem de toda a barragem de propaganda). Dado este comportamento, o Ocidente tem que rever as sua relacoes com este regime.
4) "E apesar de Putin ter disposto um exército na fronteira da Ucrânia, ele não deu a ordem para invadir e ocupar Luhansk ou Donetsk". A sério? Acredita mesmo nisto? Näo havia qualquer movimento secessionista no leste, a maioria da populacao do sudoeste nunca quis ser engolidada pelo regime putiniano, apenas uma minoria violenta, armada e paga por Putin avancou para a luta armada. Mesmo assim, o maior número de combatentes sao ex-criminosos chechenos e russos, nao ucranianos!

(...Á parte esta visao desculpabilizadora de um regime imperialista) continuacao de bom trabalho.

Joao

Eduardo Freitas disse...

Caro João (Anónimo),

Constitui evidentemente um risco reputacional contribuir para divulgar opiniões não coincidentes com o unanimismo (sufocante) nos media do mainstream e que a generalidade da blogosfera acompanha (incluindo os blogues de linha editorial liberal). À esquina da dissidência da “narrativa oficial” lá estará o que se sabe ser inevitável: “quem não é por nós está contra nós!” No caso, uma suposta “desculpabilização de Putin” à custa dos paladinos da liberdade encabeçados por Obama (ou seja, dos EUA/ NATO).

Com a (óbvia) reserva resultante do facto de o artigo não ter sido escrito por mim, tentarei não obstante endereçar as questões que colocou no seu comentário:

1) Estaline versus Putin. A contraposição é por si só tão absurda que não mereceria elaboração adicional. Apesar do assassinato semântico sistemático, FDR reconheceu um regime genocida precisamente quando decorria na Ucrânia um dos inomináveis democídios (R. J. Hummel) contemporâneos numa escala inaudita na História àquela época. Fê-lo quase 18 anos após a implantação do assassino regime soviético e, até à sua morte, continuaria a adular Estaline (o “Uncle Joe”) de tal forma que lhe entregou toda a Europa a leste do rio Elba logo em Teerão (e não em Yalta). E na altura Estaline não tinha as armas nucleares de que Putin hoje dispõe…

2)O Memorando de Budapeste deve ser lido com atenção. Sobretudo, há que evitar ler um parágrafo isolado tomando-o como uma nuvem por Juno (uma discussão interessante aqui).

3)O que o Ocidente (leia-se EUA/NATO) fez no pós-Guerra Fria foi, ao contrário do que se tinha comprometido perante Gorbatchev aquando dos desmembramento pacífico da URSS, expandir constantemente a NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte) literalmente até às portas da Rússia chegando hoje aos meridianos do Mar Cáspio e do Afeganistão). Imagine-se o que sucederia se o México ou o Canadá permitissem a instalação de uma base militar russa no seu território a kms da fronteira dos EUA!

4)É sabido que Krutschev, um outro assassino em grande escala, que aliás chefiou o partido comunista na Ucrânia sob as ordens de Estaline, resolveu “oferecer” a esta última, enquanto república da então URSS, a Crimeia (talvez em jeito de uma obscena compensação pelos crimes que ele próprio perpetrou). Esta foi apenas a até há pouco mais recente mudança na geografia de um espaço que, étnica e culturalmente, não é homogéneo. Longe disso. Não é de agora, tem séculos de disputa e, consequentemente, muito diferentes geografias/fronteiras. Por último, afirma que os secessionistas no leste e sudoeste da Ucrânia são uma minoria porque “não havia” movimentos secessionistas até, digamos, Putin “ter dado a ordem”. Não sei se serão uma minoria ou não mas não esqueço os números do último referendo na Crimeia; e quanto a “antes” não haver movimentos secessionistas ocorre-me de imediato a Jugoslávia.

Por fim, o meu obrigado pelo cumprimento de bom trabalho (à parte esta questão) no EI. Até porque é a defesa – teimosa – da liberdade que constitui o seu mote e razão de ser.

Saudações,

Eduardo Freitas

Anónimo disse...

(Continuação)

2) Expansão da NATO. Não foi a NATO que se expandiu...foram os países da esfera ex-soviética que (sabendo bem o que a casa gasta!) tentaram com todas as suas forças garantir a sua soberania e que a Tirania soviética nunca mais se repetisse. Os crimes russos na Polónia, Hungria, Ucrânia, etc, estão muito bem documentados (inclusivé neste blogue). A NATO (infelizmente!) para estes países ainda faz sentido.

3) Actuação da Rússia na Crimeia e Sudoeste Ucrâniano. A situação da Crimeia e do sudoeste teve uma actuação diferente (ambas criminosas) por parte da Rússia. Permita-me analisar as duas. No caso da Crimeia o exército regular russo avançou ilegalmente e sem insignias para ocupar bases ucrânianas e outras infra-estruturas estratégicas para alegadamente proteger a base naval russa. A partir daqui organizou um "referendo" fantoche em tempo record, sem hipóteses de campanha contraditória, sob a ponta das espingardas, com um resultado (bem soviético) de mais de 95%. Primeiro a questão política. Estou disposto a admitir que a Crimeia era a única região ucraniana que desejava maioritariamente juntar-se à Rússia (com cerca de 50-60% da população - ver aqui uma sondagem sobre as opiniões dos ucranianos sobre a integridade do território: http://www.pewglobal.org/2014/05/08/despite-concerns-about-governance-ukrainians-want-to-remain-one-country). Mais, no campo da teoria, sou completamente a favor de movimentos secessionistas, no sentido em que entidade políticas mais pequenas como o Liechtenstein ou Cantões suiços é possível às populações controlar melhor a corrupção e repressão estatal (como julgo que foi referido aqui neste blogue numa entrevista ao soberano do Liechtenstein). Agora assim nunca! Posso garantir-lhe que o que se passou na Crimeia não contribuiu em nada para o avanço da liberdade nesse território. Em primeiro lugar a questão da secessão. Na Crimeia não houve secessão, não se tornou numa entidade política independente, foi isso sim engolida por um Estado muito mais poderoso e repressivo do que o anterior, e os próprios habitantes da Crimeia serão as primeiras vítimas disso. Depois o processo "democrático". Dou o exemplo da Escócia, vai ter 2 anos de campanha, esclarecimento, onde todos os lados podem avançar sem coacção sobre os seus pontos de vista e que vai ser observada por técnicos de outros países. Versus duas semanas de aviso prévio, sem hipóteses de campanha contra, sem imprensa livre, com o país sequestrado militarmente, sem acesso ao exterior, sem observadores estrangeiros e sob a ponta da espingarda obteve-se um resultado (verdadeiramente absurdo) de mais de 95%. Agora relativamente à legitimidade de a Crimeia ser ucrâniana (porque foi "dada" pelo Krutschev). Meu caro, aqui entramos na legitimidade de contratos e acordos voluntariamente efectuados. A Crimeia foi legalmente incluida na soberania ucraniana, e a Rússia sempre aceitou isso. Repare, eu não lhe posso vender o meu carro, ficar com o seu dinheiro e passado uns tempos alegar que o carro sempre foi meu, e violentamente roubar-lhe o carro, alegando que sempre me pertenceu no passado e ainda ficar com o dinheiro. Foi isso que a Rússia fez. Há inclusivamente alguns russos (uma minoria) que tem consciência deste acto vergonhoso e descarado por parte do seu país.

Anónimo disse...

(continuação)

Relativamente ao sudoeste, a actuação russa foi diferente. Aproveitando-se da instabilidade política e da existência de uma minoria etnicamente russa (20%-30% da população nalgumas regiões) que nunca se sentiu ucraniana inundou o sudoeste primeiro com violentos agitadores e sabotadores (que foram os primeiros a provocar nas ruas do sudoeste violência e mortos) na sua maioria russos e depois, quando viu que a maioria da população não aderiu à Novorussia, partiu para uma invasão via proxie, não com tropas regulares mas com para-militares russos e mercenários chechenos. Repare no caso da vontade da população, é verdade que a maioria ali fala russo, mas também é verdade que a maioria dessa população não quer fazer parte da Rússia (ver sondagem acima). A prova de que as manifestações foram orquestradas e pagas por Moscovo está precisamente no massacre de Odessa. Dois terços dos mortos era da Rússia ou da zona oriental da Moldóvia, pagos para participar em agitações violentas (havia "turismo" da Rússia para participar em manifestações, a certa altura a Ucrânia teve que proibir a entrada de homens russos com menos de 60 anos no seu território). Abro aqui um parentesis para dizer que antes de Odessa estes agitadores tinham provocado dezenas de mortos nas ruas, e que - não concordando com esta violência - se agitadores estrangeiros vierem para a rua defender que a sua pátria seja engolida, rasgando as bandeiras do seu país...a coisa pode correr mal. Imagine que Espanha pagava a agitadores espanhóis para vir para as ruas portuguesas rasgar a bandeira e defender a integração de Portugal em Espanha, a certa altura a coisa poderia não correr bem para eles. Quando Putin viu que as populações locais não aderiam ao Pan-russismo, partiu para a agressão militar, com o fornecimento de mercenários russos e chechenos (recrutados entre os individuos mais violentos e despreziveis do país, alguns meros criminosos, outros ex-neo-nazis e ultra-nacionalistas), equipamento militar pesado cujos resultados estão bem à vista. Agora, os Ucranianos estão no seu país desejam viver em paz, em independência (finalmente!) desejam definir o seu futuro e vão lutar por ele contra esta colonização russa. O que está em causa no leste da Ucrania é a possibilidade de uma minoria conseguir colonizar a maioria da população, algo muito semelhante ao que se passava nas colónias africanas de Portugal. Mas em pleno século XXI, em pleno coração da Europa, os ucranianos tem ao seu dispor informação suficiente, são suficientemente esclarecidos para perceber o que está em causa.

Melhores Cumprimentos,
João

Eduardo Freitas disse...

Caro João,

Obrigado pelo seu (extenso) comentário a que só agora tenho disponibilidade para responder anda que muito brevemente até porque já enderecei alguns dos seus argumentos em anterior comentário.

A razão de ser deste post - e daí a escolha do artigo de Buchanan - não visa defender um regime autocrata nem muito menos incensar o seu chefe. O que se pretendeu ilustrar é o facto de todos os motivos (reais ou fabricados) serem bons para prosseguir a perigosa escalada que Washington, atiçada pelo Partido da Guerra (de estandarte azul e vermelho), promove. Passaram já 12 dias sobre o derrube do MH17 e Washington continua sem conseguir apresentar um único indício sólido, que não insulte a inteligência, relativo à autoria do disparo do míssil apesar da instantânea barragem de acusações. E todavia já aí vem mais um lote de sanções a somar as já existentes. Cui bono?

Continuamos a assistir, literalmente às portas da Rússia, ao prosseguimento da tão célebre quanto infame doutrina Wolfowitz:

«Our first objective is to prevent the re-emergence of a new rival, either on the territory of the former Soviet Union or elsewhere, that poses a threat on the order of that posed formerly by the Soviet Union. This is a dominant consideration underlying the new regional defense strategy and requires that we endeavor to prevent any hostile power from dominating a region whose resources would, under consolidated control, be sufficient to generate global power».

É a esta luz que é imaterial invocar a defesa dos "princípios democráticos" ou do "direito internacional" que são imediatamente descartáveis se as conveniências do Poder Imperial assim o aconselharem. Ou não foi Yakunovitch eleito democraticamente? (Um indivíduo corrupto? Sim, com certeza. Mas e o que são Yushchenko, Timoschenko ou até o actual presidente Poroschenko?)
Qual o critério para tornar instantaneamente legítimo um golpe de estado nuns casos e noutros não? O reconhecimento do Poder externo Imperial hoje dominante que, mais que provavelmente, contribuiu para a sua execução (à semelhança das sucessivas revoluções "coloridas” ou "primaveris")? E que dizer da fixação de arbitrárias “linhas vermelhas” com ameaças de guerra explícitas?

Sucede que neste caso da Ucrânia, do “lado de lá” há um império ancestral, que se sente desconsiderado na qualidade que se arroga de Grande Potência, que está a ser desafiada à sua porta por uma entidade imperial cuja sede está a 8000 km de distância, e que possui armas nucleares. O que fariam os EUA se, por hipótese, o México deixasse de ser um país "amigo"?

Cordiais saudações,

Eduardo Freitas