Outras vias
Terá início esta semana mais uma reunião do grupo de países apelidado de BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Um dos tópicos desta reunião será a criação de um banco que possa servir, especificamente, as necessidades destes países. A discussão acerca deste assunto já tem algum tempo, mas tornou-se uma necessidade premente uma vez que não foram implementadas as reformas necessárias no seio das estruturas existentes (FMI, Banco Mundial - que estão pendentes desde 2010) para acomodar a nova realidade económica e financeira mundial.
Demoremos algum tempo a considerar este facto. Os BRICS estão a querer tomar a iniciativa de criar uma infra-estrutura que se torne alternativa ao FMI e BM na defesa dos seus interesses.
A discussão, para além da composição relativa aos fundos e à participação de cada um dos países, já se centra na localização da sua sede. E aqui vão testar-se as vontades conciliatórias no contexto de tensões históricas.
Parece óbvio que estes países já reconheceram os limites da arquitectura e das práticas financeiras do Ocidente, em particular o propósito dessa arquitectura na projecção do interesse americano através do dólar.
Não vejo estas outras vias como negativas. Antes mostram que é possível diversificar as estruturas de poder económico e financeiro para corresponderem às necessidades de cada um dos seus agentes. Não será, seguramente, uma simples coincidência que estes impulsos transformadores se tornem evidentes ao mesmo tempo que o edifício do todo poderoso dólar mostra as suas deficiências estruturais.
Ou acreditamos que coincidências possam marcar os actos desta peça?
No interesse da pura especulação, pergunto-me: o que farão a Indonésia, o México, as Filipinas, a Turquia, a Coreia do Sul e o Vietname, depois de ser criada a nova rede financeira estruturante dos BRICS?
4 comentários:
Luís,
Por coincidência, passam hoje exactamente 70 anos sobre o arranjo de Bretton Woods que institucionalizaria o dólar americano como moeda de reserva mundial.
Simon Black, aqui, discorre num registo semelhante e atreve-se mesmo a prever a queda do trono (do dólar) num horizonte de 2 a 3 anos. Os governos de Portugal e da Grécia parecem-lhe ser candidatos prováveis aos primeiros emitentes de "dívida soberana" denominada em renminbi.
Os ventos de mudança sopram cada vez mais fortes e muitos dos actos de força a que assistimos por parte do império, não me parecem ser mais que sinais da sua crescente e inevitável decadência.
Eduardo,
Há algum tempo que, relativamente a estes assuntos, afasto a hipótese de simples coincidências para os compreender ou explicar. Há estudo a fazer da minha parte para perceber se os ciclos ajudam a trazer luz nestas matérias. No caso desta conferência BRICS, julgo que o realismo da táctica político suporta esta escolha (de data e de tema). E espera-se que os EUA compreendam isso, pois têm estado a bloquear desenvolvimentos nas reformas do FMI, exigidas por estes novos poderes.
Quanto a Portugal ser um dos primeiros candidatos a emitir dívida em RMB´s… calma. Ou há mais agentes europeus a fazê-lo (a Alemanha já lançou fundos em RMB´s), ou não seremos os coveiros (declarados, pelo menos) dos "amigos" americanos.
Já agora, Eduardo, falta acrescentar que a última machadada na credibilidade do sistema-dólar se deu em 15 de Agosto de 1971, ou seja, estamos a, precisamente, um mês de comemorar 43 anos dessa trágica decisão. Esse foi um verdadeiro default americano.
Tempos de mudança, sem dúvida.
Saudações,
LV
Para os que acompanham este blog as "pancadas de Molière" deste espetácular "realinhamento do Dolar" já soaram há muito. Estamos em pleno drama.
Infelizmente neste teatro toda a "plateia" estará, quer queira quer não, quer ausente quer presente, envolvida na trama.
Não haverá "distanciação brechtiana" que nos salve.
PS. O envolvimento do público no enrredo, quando este lhe diz fortemente respeito, pode por vezes atingir formas não fáceis de controlar.
"Hope for the best, prepare for the worst".
JS,
O drama existe. Latente, dormente. À espera que um dos grandes Missionários diga o que toda a gente se recusa a nomear. Nesse momento, de contornos trágicos, agitar-se-ão as massas na direcção das "saídas". Provavelmente para as encontrar bloqueadas.
Creio, todavia, que temos que ver as massas como personagens da peça. Sem elas a dinâmica de poder não se exercia. Daí que, não conhecendo a "distanciação brechtiana", me parece adequada.
O facto de não haver uma referência enquadrada a estas mudanças nos meios de comunicação convencional, não deve fazer esquecer da sua intencionalidade. Se me é permitida a composição: é um silêncio desejado para ambiente sonoro do guião que - todos - concretizamos. Trágico e inexorável.
Agora, haverá alguns que se preparam para espreitar "para lá do horizonte".
Saudações,
LV
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