De modo algum fico espantado pelo facto de não conseguir encontrar, em páginas portuguesas na internet, uma referência a esta confissão pública no Wall Street Journal (Andrew Huszar: Confessions of a Quantitative Easer), publicada no passado dia 11 de Novembro do corrente. Isto porque creio ser bem provável que tal "esquecimento" não seja alheio à visão hagiográfica dos nossos media relativamente aos banqueiros centrais, partilhada por todos aqueles (por exemplo, "Mario Draghi, uma vez mais, esteve à altura da situação") que acham têm fé em que uns adequados passes de alquimia possam substituir as dores próprias de enfrentar a realidade. Não surpreende pois que se procure evitar o que quer que seja que ponha em causa a imensa e inestimável sabedoria e compaixão dos pontífices em exercício (aqui bem patentes).
Ron Paul há décadas que vem dedicando boa parte da sua vida pública a desmontar esta tão idílica quanto falsa perspectiva da prestidigitação monetária dos supostos illuminati. Volta a fazê-lo em Federal Reserve Steals From the Poor and Gives to the Rich, texto de que achei útil proporcionar uma tradução.
18 de Novembro de 2013
Na quinta-feira passada, o Comité de Assuntos Bancários do Senado iniciou a audição de Janet Yellen no seguimento da sua indigitação para presidente da Reserva Federal. Como se esperaria, a Sra. Yellen referiu que iria continuar a política de "flexibilização quantitativa" do Fed (QE [Quantitative Easing]), apesar do fracasso da QE na melhoria da economia. Por coincidência, dois dias antes das audições a Yellen, Andrew Huszar, um ex-funcionário do Fed, pediu publicamente desculpas [link acrescentado] ao povo americano pelo seu papel na QE. O Sr. Huszar chamou à QE "o mais secreto resgate a Wall Street de todos os tempos".
Há não mais de cinco anos atrás [alusão à primeira candidatura de Ron Paul à presidência dos EUA, em 2008], teria sido inédito ouvir um conhecedor [do funcionamento por dentro] de Wall Street e ex-funcionário do Fed a falar tão abertamente do modo como o Fed age como um Robin Hood às avessas. Mas um rápido olhar para os números mais recentes do desemprego mostra que a QE não está a beneficiar o americano médio. É cada vez mais óbvio que a política de resgates do Fed pós-2008, a "impressão" de dinheiro [a partir do nada] e a compra de obrigações beneficiou os grandes bancos e as sociedades de investimento com [fortes] ligações políticas. A QE é um exemplo tão flagrante de capitalismo de compadrio [crony capitalism] que faz com que o caso Solyndra [link] pareça um luminoso exemplo de funcionamento de um puro e livre mercado!
Seria um erro pensar que com a QE seria a primeira vez que as políticas do Fed beneficiaram aqueles que vivem com desafogo à custa do americano médio. As políticas do Fed beneficiaram sempre os capitalistas de compadrio e os políticos defensores da grande despesa pública em prejuízo [e às expensas] do americano médio.
Através da manipulação da oferta monetária e da taxa de juro, as políticas da Reserva Federal criam inflação e desse modo corroem o valor da moeda. Desde que a Reserva Federal abriu as suas portas, há cem anos atrás, o dólar perdeu mais de 95% do seu poder aquisitivo - sim, é isso mesmo, hoje são necessários 23,70 dólares para comprar o que um dólar comprava em 1913!
Como é assinalado pelos economistas da Escola Austríaca, a criação da nova moeda não afecta toda a gente de uma forma homogénea. Os que estão bem relacionados beneficiam com a inflação, pois são os primeiros a receber o dinheiro recém-criado, antes que o aumento geral dos preços se espalhe pela economia. É assim óbvio que as classes média e trabalhadora [working class] norte-americanas são as mais atingidas pelo aumento do nível de preços.
O Congresso também beneficia com a desvalorização da moeda, uma vez que ela lhes permite aumentar a despesa com o estado social e guerreiro [warfare] sem tributar directamente as pessoas. Assim, o aumento só é sentido [pelas pessoas] através do oculto "imposto inflacionário". Eu já afirmei com frequência que o imposto da inflação é um dos piores impostos porque é um imposto escondido e é regressivo [ou seja, é mais penalizador para os mais pobres]. É claro que há um limite quanto ao tempo que o Fed pode facilitar a despesa do estado grande e gordo sem provocar uma crise económica.
Longe de promover uma economia sólida para todos, a Reserva Federal é a principal causa dos ciclos económicos de expansão-contracção, bem como a principal facilitadora do estado grande e do capitalismo de compadrio. Felizmente, nos últimos anos, mais americanos tomaram consciência da forma como o Fed está a afectar as suas vidas. Estes americanos uniram esforços para educar os seus concidadãos sobre os perigos da Reserva Federal e uniram esforços para promover transparência sobre a Reserva Federal através da aprovação da lei relativa à "Auditoria ao Fed".
Auditar o Fed é um excelente primeiro passo em direcção à restauração de uma política monetária que funcione em benefício do povo americano, não dos interesses especiais. Um outro passo importante consiste em revogar as leis relativas ao curso legal que restringem a capacidade das pessoas para usar a moeda da sua escolha. Isso permitiria aos americanos protegerem-se dos efeitos das políticas do Fed. Auditar e acabar com o Fed, e permitir aos americanos utilizar a moeda da sua escolha, deve constituir uma prioridade para qualquer pessoa realmente interessada na restauração da paz, da prosperidade e da liberdade.
3 comentários:
o avô materno do constâncio era o 'ti Chic barbêro'
'quem te manda a ti sapateiro tocar rabecão'
o livro do sô zé da cicuta já está à venda na Fnac Colombo com 10% de desconto e ninguém lhe pega
Como o problema se tem agravado noutros países que não estão na alçada do FED, preconizo que se avance rapidamente numas novas estrategias -talvez reduzir as premissas esquerda/direita e capitalismo/socialismo e substituir por uma estrategia diferente de uso dos impostos para o papel de redistribuir o rendimento.
António,
Quando refere que se deve "substituir por uma estratégia diferente de uso dos impostos para o papel de redistribuir o rendimento" quer dizer que tal estratégia não existe (e que deveria passar a existir)? Compreendo bem?
É um facto de que os problemas se têm agravado e não apenas fora dos EUA. Tanto nos EUA como na Europa (EU), Japão, India, Tailândia e (até!) a China os problemas se têm agravado de um modo silencioso, digamos. Quando temos os bancos centrais como compradores de 50 a 60% das dívidas soberanas (numa endogamia inacreditável) basta apenas um deslize uma dessas peças. E pode ser uma peça pequena. Por exemplo? Um súbito agravar das condições políticas em Portugal (com as consequências nas taxas) ou o rebentar da bolha imobiliária na Tailândia.
A dimensão desta experiência keynesiana é desconhecida na história humana.
Saudações,
LV
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