quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Lema da urgência despesista: Primeiro, gasta-se; depois, logo se vê

Imagem daqui
Nancy Pelosi, anterior Speaker da Câmara dos Representantes nas vésperas da aprovação do Patient Protection e Affordable Care Act (já conhecida por "Obamacare") e em plena e acesa controvérsia, nomeadamente de que não tinha havido tempo para os Representantes lerem todo o projecto de lei (de mais de 2000 páginas de extensão!) produziu esta afirmação espantosa, perante as câmaras de televisão (9 de Março de 2010):
"We have to pass the bill so that you can find out what is in it away from the fog of the controversy." (Tradução: Precisamos aprovar o projecto de lei para que se possa descobrir o que ela contém, longe da névoa da controvérsia.)
Algo de parecido ao método de avaliação de um melão - temos que o abrir e de o comer até ao fim para avaliar da sua real qualidade! Este e outros episódios semelhantes levaram a que o senador Rand Paul a viesse a apresentar uma resolução segundo a qual, por cada 20 páginas de um projecto de lei, seria obrigatório conceder pelo menos um dia aos membros do Senado para que a pudessem ler antes de ser iniciar o seu debate e eventual votação.

Imagem retirada daqui
Lembrei-me de tudo isto ao ler esta notícia - La CE tacha de "realmente insatisfactorio" el número de pasajeros de algunos AVE (A Comunidade Europeia classifica de "realmente insatisfatórios" os números de passageiros de alguns AVE (nome por que são conhecidos os comboios de Alta Velocidade em Espanha)).

Segundo a notícia, um deputado espanhol catalão da CiU, Ramon Tremosa,  intervindo  no plenário do parlamento europeu na presença do comissário europeu dos Transportes, Siim Kallas, afirmou que "um em cada quatro dos trajectos do AVE só transporta um passageiro por dia" (!) e que estações servidas pelo AVE como Tardienta, Huesca, Calatayud, Antequera, Puertollano, Cuenca, Utiel-Requena o Puente Genil não recebem mais do que um ou dois passageiro por dia (!).

Em resposta, Siim Kallas terá reconhecido que a exploração de alguns troços é "realmente insatisfatória" ainda que a sua análise se deva fazer ao longo de um horizonte de longo prazo: "Nas análises custo-benefício do comboio de alta velocidade em Espanha têm-se em conta pelo menos vinte a vinte e cinco anos de actividade." Por outro lado, afirmou ainda, "as análises de custo-benefício devem considerar não apenas a rentabilidade financeira, como também a rentabilidade económica no conjunto do país e da União Europeia". Acresce que, segundo o comissário, "na avaliação da rede espanhola de alta velocidade, se deve considerar o valor acrescentado europeu resultante de la integração da Península Ibérica na rede RTE-T através de linhas interoperáveis aptas para o tráfico misto [passageiros e mercadorias]". (Itálicos meus.)

E eis assim novamente, com ligeiras cambiantes, o pleno funcionamento do método de "avaliação do melão". No caso, para tentar confundir o pagode nada como invocar o argumento "definitivo" da suposta supremacia do "económico" sobre o "financeiro" o que, no contexto da despesa pública, apenas significa que são irrelevantes as contas de exploração de um qualquer empreendimento público que pode assim juntar-se a todos os outros investimentos (?) que mais não são que gigantescos empreendimentos de destruição (consumo) de capital por mera decisão de um qualquer político que quer deixar "obra". E dívida, claro.

4 comentários:

JS disse...

"... por mera decisão de um qualquer político que quer deixar "obra"."

E que foi ou conivente, ou -na melhor das hipóteses- aldabrado por quem tem os cordelinhos na mão.
Ou seja: ou vigarista ou imbecil.
Vislumbra-se outra hipótese mais benigna?.

Floribundus disse...

é fácil gastar o dinheiro dos outros.

acreditava que o grupo cultural e recreativo ratton
pretendia que o MONSTRO se passeasse num andor suportado pela economia dos neocons

pensava, na minha ignorância, que ratoneiro derivava das palavras ratton ou largo dos ratos,

mas fiquei esclarecido

BC disse...

Não tenho uma visão tão pessimista dos políticos. Acho que alguns fazem "obra" de boa fé e no interesse do país. O problema é que são maus gestores. E o problema da má gestão no Estado é ser feito com o dinheiro confiscado em impostos e nunca ter consequências para os decisores quando corre mal.

Como ilustra bem o texto faz-se e depois logo se vê o que acontece.

Eduardo Freitas disse...

Problema que se me afigura insanável, matéria a que o blogue se irá dedicar com particular afinco.