segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Gramsci, o papa Francisco, jesuítas e proselitismo

Patrick J. Buchanan, uma presença frequente neste blogue, ainda que não pelos seus pontos de vista sobre economia (bem pelo contrário), não é um optimista. Explana longamente esse pessimismo informado, por exemplo, em Death of the West (2002) como no recente Suicide of a Superpower (2012). Como explica em artigo publicado na semana passada, Papal Neutrality in the Culture War, o papado de Francisco em nada contribuiu para moderar o seu pessimismo. Creio compreender o seu ponto de vista partilhando muitas das suas perplexidades perante a actuação do papa Francisco. A tradução que se segue é da minha responsabilidade.
Sexta-feira, 15 de Novembro de 2013

"O papa Francisco não quer guerreiros culturais; ele não quer ideólogos", disse o bispo Blase Cupich, de Spokane, Washington:

"O núncio disse que o Santo Padre pretende bispos com sensibilidade pastoral, pastores que conheçam o odor das ovelhas."

O bispo Cupich estava a veicular as instruções que o núncio papal havia trazido de Roma para guiar os bispos dos EUA no processo de escolha de um novo líder.

Eles escolheram o arcebispo Joseph Kurtz, de Louisville, Kentucky, detentor de um mestrado em assistência social, para suceder ao arcebispo Timothy Dolan que Laurie Goodstein, do New York Times, descreve assim [link]:
"Um loquaz evangelista, confortável em frente a uma câmara, que liderou os bispos no confronto de grande notoriedade contra a administração Obama quanto a uma disposição na legislação sobre cuidados de saúde que exige à maioria dos empregadores que tenha um seguro que cubra [a despesa com] os anticoncepcionais dos seus empregados."
Essa legislação exige igualmente aos empregadores a cobertura das drogas indutoras do aborto bem como das esterilizações.

Eis aqui mais uma confirmação que Sua Santidade procura mover a Igreja Católica para uma postura de não-beligerância, se não mesmo de neutralidade, na guerra cultural em curso pela alma do Ocidente.

Há um pequeno problema com a neutralidade. Como Trotsky observou, "Você pode não estar interessado na guerra, mas a guerra está interessada em você". Para a igreja, a sua auto-exclusão da guerra cultural não visa pôr termo a essa guerra, significa perdê-la.



Quais as implicações que daí adviriam? Será que não é já possível vê-las?

Na América, a família desintegrou-se. Quarenta por cento das crianças brancas da working class [abaixo da classe média] nascem fora do casamento, tal como sucede a 53 por cento das crianças hispânicas e a 73 por cento das crianças negras. As crianças de lares desfeitos têm uma muito maior probabilidade de vir a abandonar a escola, usar drogas, participar em gangues, cometer crimes, acabar na prisão, perder a alma, e vir a produzir ainda mais uma geração de almas perdidas.

Goodstein cita o Santo Padre ao incluir entre os "mais sérios dos males" de hoje "o desemprego dos jovens". E apela aos católicos para que não fiquem "obcecados" com o aborto ou com o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Mas será realmente o desemprego juvenil um mal moral mais grave do que o massacre diário de 3.500 nascituros na terra que costumávamos chamar de "País de Deus"?

As encíclicas papais como a Rerum Novarum e a Quadragesimo Anno têm muito para ensinar sobre justiça social numa sociedade industrial.

Mas qual é a competência especial da Igreja para fazer face ao desemprego juvenil? Terá a Cúria desenvolvido algum sólido trabalho académico quanto ao impacto económico do salário mínimo?

A revolução cultural apregoada pelo marxista Antonio Gramsci continua a sua "longa marcha" através das instituições do Ocidente, e a obter sucesso onde as revoluções violentas de Lenine e Mao falharam.

Ela está a provocar uma transvalorização [link] de todos os valores. E não está interessada numa trégua com a igreja do papa Francisco, mas num triunfo sobre a igreja que ela injuria como o grande inimigo na sua luta.

De facto, depois de décadas de guerra cultural empreendida contra o Cristianismo, o Vaticano possa ponderar o estado da Fé.

A nossa civilização está a ser descristianizada. A cultura popular é um esgoto. A promiscuidade e a pornografia estão pandémicas. Na Europa, as igrejas esvaziam-se enquanto as mesquitas se enchem. Na América, a leitura da Bíblia e a oração são proibidas nas escolas, enquanto os painéis cristãos são purgados das praças públicas. Oficialmente, o Natal e a Páscoa não existem.

O papa, afirma Goodstein, refere-se ao proselitismo como um "solene disparate". Mas proselitar é converter os não-crentes.

E quando Cristo admoestou os seus apóstolos "Ide e ensinai todas as nações", e dez dos seus doze sofreram o martírio em consequência, não estavam eles envolvidos na verdadeira missão da Igreja - trazer almas a Cristo?

O papa Francisco é proveniente dos jesuítas.

Daí uma interrogação: Será que jesuítas lendários como o Sto. Isaac Jogues e os Mártires da América do Norte [link] cometeram um erro ao proselitar e baptizar, quando poderiam ter trabalhado na solução do desemprego dos jovens entre os Moicanos?

Um ateu italiano cita o papa como tendo afirmado que "Cada pessoa tem a sua própria concepção do bem e do mal", e cada um deve "prosseguir o bem e combater o mal tal como os concebe".

Será que isso não reflecte o relativismo moral do Príncipe Hamlet, quando ele disse a Rosencrantz que "Nada há de bom ou de mau que o não seja por só pensarmos que é?" No entanto, não é missão da Igreja diferenciar o bem do mal e condenar o último?

"Quem sou eu para julgar", disse o papa Francisco referindo-se aos homossexuais.

Bem, ele é o papa. E mesmo o mais humilde pároco tem que produzir juízos morais num confessionário.

"Desde que Francisco se tornou papa", escreve Goodstein, que "os níveis de aprovação atingiram valores estratosféricos. Até mesmo os ateus aplaudem."

Especialmente os ateus, imagina-se.

Enquanto o Papa Francisco não alterou nenhuma das doutrinas católicas nas suas entrevistas e digressões, ele tem estado a semear a confusão entre os fiéis, um alto preço a pagar, mesmo considerando os "estratosféricos" indicadores das sondagens de opinião.

Se não me falha a memória, o Senhor disse: "Apascenta as minhas ovelhas" e não "tira o odor das ovelhas". E ele não se referia à sopa dos pobres, mas ao ainda mais importante alimento espiritual essencial à vida eterna.

Mas então aqueles eram outros jesuítas. E isso foi há muito tempo.

2 comentários:

Floribundus disse...

em 1918 Oswald Spengler publicou
'der Untergang des Abendlandes'

traduziram naufrágio por queda

Eduardo Freitas disse...

Caro Floribundus,

Uma arte, a do comentário lapidar!

Saudações