terça-feira, 16 de agosto de 2011

É tão raro acontecer que há que registar

Tenho em muito fraca conta a opinião manifestada publicamente pela generalidade dos economistas portugueses. Em especial, acho inaceitável que a imprensa portuguesa, em especial, a supostamente especializada, continue a papaguear o discurso da ortodoxia keynesiana que se resume numa ideia: mais despesa pública, ainda mais despesa pública e ainda ainda mais despesa pública (com o dinheiro dos outros) ad infinitum enquanto suprime qualquer voz dissonante como se nada existisse fora do paradigma keynesiano.

Por essa razão, o artigo que o Professor Avelino de Jesus assina hoje ao Jornal de Negócios (edição em papel) é uma autêntica pedrada no habitual charco que sinto na obrigação realçar, ainda que eu esteja longe de concordar com tudo o que Avelino de Jesus escreve neste artigo. O autor pretende rebater as críticas que foram dirigidas ao governo por este ter optado por não aplicar a sobretaxa extraordinária de IRS sobre os rendimentos de capital. Transcrevo de seguida o excerto que me parece mais significativo:
«Vejo quatro fortes motivos para a defesa da medida tal como foi formulada e apresentada [pelo governo].

Primeiro. Não estamos perante um cataclismo, uma desgraça nacional, cujos custos haverá que repartir com a maior justiça possível. Estamos, antes, perante a possibilidade de corrigir uma errada política económica que nos últimos anos nos tem afastado do crescimento e nos conduziu à divergência real da União Europeia. A equidade, não sendo um objectivo de menor importância, não é, seguramente, na actual situação, o principal objectivo imediato e de curto prazo da política económica. O principal objectivo deverá ser o de provocar o crescimento da riqueza no médio e longo prazo. É lamentável que, com frequência superior à que desejaríamos, a equidade de curto prazo e o crescimento sejam contraditórios. Mas esta é a realidade que defrontamos no momento presente.

Segundo. A "insinuação" do senhor ministro das Finanças é na verdade uma cristalina evidência: a contradição entre o capital e o trabalho é apenas uma aparência. No médio e longo prazo, a equidade social depende do crescimento. As medidas de crescimento que no imediato firam a equidade, no fundo, poderão, como é o caso, criar condições para a sua melhoria. Mas para os empedernidos ouvidos do keynesianismo reinante, este argumento não conta. Para aqueles, só existem o imediato e o curto prazo. As condições para o progresso e o crescimento escapam-lhes1.

Terceiro. Considerando os media que temos, doutrinados num igualitarismo cego, eficazes propagandistas de falsos lugares comuns junto dos eleitores, esta medida poderá ser entendida como manifestação de vontade dos novos poderes públicos de não se orientar por eleitoralismo fácil e atraente, mas trágico para os interesses profundos do País, como a nossa história recente tem evidenciado.

Quarto. Embora alguns ainda não se tenham dado conta, os portugueses tentam há muito erguer uma economia capitalista contra a vontade - e perante o boicote - das suas elites. Ora, numa economia capitalista ou que o pretende ser, a resolução dos problemas de crescimento está na aceleração da acumulação de capital. É esta que permite o aumento do emprego e a melhoria dos salários. Num contexto em que os capitais estrangeiros se sentem acossados e não afluem e que o escasso capital português se põe ao fresco nos centros que lhe são amenos, dar um sinal - por pequeno que seja - de que se pretende inverter a situação deve ser saudado.
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1Na verdade, Keynes deu o impulso inicial ao considerar que poderia dispensar uma teoria do capital, por irrelevante. Modernamente, em geral, estuda-se o capital como simples capítulo da teoria financeira. Mas a teoria do capital é vista como parte esotérica e irrelevante da ciência económica.
Nem sempre foi assim. Na história do pensamento económico, há inúmeros e extensos volumes sobre a teoria do capital [nomeadamente, e em particular, dos "Austríacos"]. Actualmente, a esmagadora maioria, evita os intrincados desenvolvimentos técnicos e filosóficos que a história da ciência produziu. O capital tornou-se um mero agregado da distribuição de rendimento, deixando de ser analisado enquanto processo e relação social conforme propuseram os melhores cultores da ciência económica (por portas travessas, Karl Marx incluído).

1 comentário:

RioD'oiro disse...

Já lá canta um link:

http://fiel-inimigo.blogspot.com/2011/08/sic-e-silly-season.html