domingo, 30 de setembro de 2012

Austeridade e dissociação cognitiva

Um excerto da crónica de hoje de Alberto Gonçalves:
"Ao que tudo indica, o povo em protesto não quer aumentos de impostos e, em simultâneo, não quer a redução na despesa que compensaria a manutenção dos impostos tal como estão ou estavam. O povo pretende a expulsão da troika e não se encontra minimamente preparado para a penúria que a partida da troika implicaria. O povo rejeita a austeridade sem perceber que a alternativa é uma austeridade maior e menos meiga. O povo está contra o Estado e vive apavorado com a ideia de que o Estado recue nas suas vidas. O povo insulta o Governo que desastradamente tenta corrigir as contas públicas embora não deseje que as corrija com acerto, nem dedique grandes insultos aos governos que deliberadamente transformaram as contas públicas na ruína actual. O povo, em suma, é realista à maneira do Maio de 68: pedindo o impossível. Impossível no sentido de que não tem pés nem cabeça."
Acresce, como bem observa o cronista logo a seguir ao trecho transcrito, que o problema cognitivo não se circunscreve ao povo (relembrando um memorável post de João Caetano Dias). De facto,  a bandeira desta doença profunda é hasteada pela quase totalidade dos media e das nossas elites.

A via do default, isto é, do incumprimento do serviço da dívida e mesmo do seu repúdio, é um caminho possível para a saída da terrível situação em que nos encontramos (decorrente do gigantesco processo de endividamento público para que os nossos governos nos arrastaram, pelo menos nos últimos 17 anos). Não me custa admitir até que essa seja uma saída moralmente defensável. É, porém, uma via de dor, instantânea, profunda e duradoura. Que ninguém tenha a menor dúvida disso.

Sem comentários: