"Quando a pilhagem se torna um modo de vida para um grupo de homens numa sociedade, ao longo do tempo, eles criam para si um sistema legal que o autoriza e um código moral que o glorifica."
Frédéric Bastiat
domingo, 30 de junho de 2013
Citação do dia (122)
sexta-feira, 28 de junho de 2013
Mitos persistentes: a deflação é um fenómeno a evitar
Frank Hollenbeck, professor na Universidade Internacional de Genebra, em What’s So Scary About Deflation?, desmonta o mito associado à suposta malevolência de uma baixa de preços sustentada no tempo. Um conhecimento de história económica (na parte não suprimida pelas universidades), deveria ser suficiente para descartar uma tese tão cara à generalidade dos economistas que constitui um "terror" para os banqueiros centrais. Já por aqui falei várias vezes do fenómeno, perceptível para o grande público pelo menos desde há 20 anos) que o sector das tecnologias de informação e telecomunicações é um gigantesco exemplo da infirmação da tese dos malefícios da deflação.
O artigo de Hollenbeck, situado entre um artigo de divulgação para o leigo e uma primeiríssima introdução (Econ 101) académica à disciplina, parece-me muito interessante na explanação dos pontos de vista da Escola Austríaca a que o autor deste blogue, paulatina mas crescentemente, vem aderindo (e defendendo). Como de costume, a tradução (e os seus erros) são da minha responsabilidade.
O artigo de Hollenbeck, situado entre um artigo de divulgação para o leigo e uma primeiríssima introdução (Econ 101) académica à disciplina, parece-me muito interessante na explanação dos pontos de vista da Escola Austríaca a que o autor deste blogue, paulatina mas crescentemente, vem aderindo (e defendendo). Como de costume, a tradução (e os seus erros) são da minha responsabilidade.
Quando se fala de deflação, o pensamento económico dominante torna-se não na ciência do senso comum, mas na ciência do absurdo. A maioria dos economistas de hoje são rápidos a afirmar que "um pouco de inflação é uma coisa boa", e temem a deflação. Claro que, nas suas vidas privadas, esses mesmos economistas vasculham os jornais em busca dos mais recentes produtos à venda.
A pessoa que melhor simboliza o medo de deflação é Ben Bernanke, o presidente da Reserva Federal. A interpretação que fez da Grande Depressão enviesou em muito a sua opinião contra a deflação. É verdade que a Grande Depressão e a deflação andaram de mãos dadas em certos países; mas nós devemos ter o cuidado de distinguir entre associação [correlação] e causalidade, e avaliar correctamente o sentido da causalidade [itálico meu]. Um estudo recente de Atkeson e Kehoe [link], abrangendo um período de 180 anos em 17 países, não detectou relação alguma entre deflação e depressões. Na realidade, o estudo encontrou um maior número de episódios de depressão acompanhados de inflação do que de deflação. Durante este período, em 65 dos 73 episódios de deflação não ocorreram depressões, e em 21 das 29 depressões não sucederam episódios de deflação.
Uma deflação sui generis (daqui)
O principal argumento contra a deflação é o de que quando os preços estão em queda, os consumidores irão adiar as suas compras para aproveitar preços ainda mais baixos no futuro. É claro que é suposto que tal situação conduza à redução da procura corrente, o que fará com que os preços caiam ainda mais, e assim por diante, até entrarmos numa espiral deflacionária/depressiva da economia. O sentido da causalidade é claro: a deflação provoca depressões. É possível encontrar este argumento em quase todos os livros de texto introdutórios de Economia. O Fed de St. Louis escreveu recentemente:
"Embora a ideia de preços mais baixos possa soar atractiva, a deflação é uma preocupação real por vários motivos. A deflação desencoraja a despesa e o investimento porque, ficando os consumidores na expectativa que os preços venham a cair ainda mais, eles diferem as suas compras preferindo pelo contrário poupar, esperando por preços ainda mais baixos. A redução da despesa, por sua vez, reduz as vendas e os lucros das empresas o que, finalmente, conduz ao aumento do desemprego."
quinta-feira, 27 de junho de 2013
O capitalismo de fachada é uma fachada de liberdade
Via a Arte da Fuga, Donald Boudreaux, professor de economia da universidade de George Mason (um dos editores do Cafe Hayek), intervindo no Fórum de Liberdade, em Oslo, no início deste mês:
O capitalismo de fachada significa uma fachada de liberdade :
O dogma que sustenta que as actividades económicas são de alguma forma menos importantes ou edificantes que as actividades não-económicas está errado. E é também é perigoso, pois ajuda a alimentar a falsa e fatal distinção entre liberdade económica e não-económica.
A liberdade é um todo, é indivisível [link meu]. Tratá-la de outra forma leva a ameaçá-la na íntegra - enfraquecendo-a em todas as frentes. E a consequência de assim agir levará a qualquer coisa que não é o progresso em direcção a uma sociedade mais civilizada, mais pacífica e mais próspera.
Os extraordinários e inestimáveis benefícios da regulação
Em contraponto aos Tenebrosos malefícios da concorrência e da desregulação, desaparecida (para sempre?) que foi "la grandeur", é tempo de Hollande accionar o "excepcionalismo cultural". Para isso, não encontra nada melhor que fixar descontos máximos para os livros, justificando o injustificável, alegando o que no plano histórico se verificou ser comprovadamente falso desde o início das teorias intervencionistas estatais - de que o "excesso" de concorrência é uma prática predatória tendente a afastar os outros competidores do mercado, momento a partir do qual os preços, agora de monopólio, voltariam a subir para patamares superiores aos iniciais. Há pois que impedir que semelhante malfeitoria se concretize. Os únicos monopólios que existiram com carácter duradouro foram os constituídos, legalmente, pelo próprio estado. É certo que haverá grupos beneficiados com isto: os livreiros tradicionais, Mas não é menos certo que totalmente à custa de todos os consumidores de livros.
Títulos idiotas (2)
Depósitos de particulares e pequenas empresas gozam de protecção adicional.
Estão agora os depósitos, de particulares e pequenas empresas, mais seguros? NÃO, como se tornará evidente para quem ler a notícia. A única forma de proteger o que actualmente se designa, de forma imprópria, de "depósitos" bancários seria um regime em que os bancos respeitassem um regime de reservas a 100% (petição aqui). Isto não significa obrigar os bancos a adoptar um sistema bancário dessa natureza. Os clientes (depositantes) que escolhessem depois o regime que preferissem. Claro que, todos aqueles que optassem pelo regime actual enfrentariam, a suas exclusivas expensas, o risco de perderem as suas poupanças, em caso de falência da instituição bancária. Lembram-se da Dona Branca?
Esta é uma "notícia" muito semelhante àquelas outras que veiculam, com uma regularidade próxima de um bom relógio suíço, que, afinal, os preços da energia não irão aumentar TANTO como se chegou a pensar que acontecesse. Parece que se espera que os cidadãos cantem hossanas ao prodigioso esforço dos governantes de ocasião até porque nunca se esquecem de "proteger" os mais desfavorecidos (fazendo-os pagar um aumento que não é tão grande quanto aquele que os restantes terão de suportar)!
É o FMI um organismo (neo)liberal?
Em três minutos e quinze segundos, Juan Rámon Rallo, doutor em Economia e director do Instituto Juan de Mariana, um think-tank independente com sede em Madrid, desfaz alguns pequenos (grandes mitos) acerca do FMI. De como nasceu, para que nasceu e o que ele é hoje. Útil nos tempos que correm.
Meditação e fecho (por hoje)
Recuso-me - recusar-me-ei sempre - a catalogar uma classe profissional no seu todo, especialmente se muito numerosa, como se de uma amálgama se tratasse. Como em todas as profissões, há uns bons (uns deles muito bons), há os maus profissionais (alguns mesmo demasiado e irremediavelmente péssimos) e há, depois, a grande massa dos "medianos" cujos comportamentos e atitudes dependem em muito da liderança (ou falta dela) de que forem alvo. Parafraseando Alberto Gonçalves, fabricar uma imagem idílica de uma dada actividade profissional é equivaler as fraudes aos profissionais sérios - e caluniar estes. "Pior: nivelar os professores por cima é uma burla idêntica à padronização por baixo que há décadas se aplica aos alunos e que, de resto, torna anacrónica a conversa acerca das virtudes e defeitos do ensino". Não é preciso acrescentar mais nada.
Coisa diferente é apreciar as organizações que reclamam para si a legitimidade de representar uma dada classe na sua totalidade (ou mesmo de parte dela). Como terei sido dos poucos bloggers que ainda não abordou o tema da greve dos professores às avaliações, agora ao que parece suspensa, chegou a altura de escrever algo sobre o tema.
Já fui, numa encarnação recuada, professor do ensino básico e secundário ("provisório", segundo a nomenclatura da altura) e conheci muitos bons professores ou que o foram tendo entretanto deixado a profissão. Como aluno, tive muitos professores ao longo do percurso escolar, mas não consigo lembrar-me de cinco professores de excepção. Em contrapartida, lembro-me perfeitamente de um numeroso grupo de professores que não hesitaria em classificar de maus, particularmente na Universidade (e não me licenciei eu em Sociologia, como sucedeu a Alberto Gonçalves...). Mas a minha "amostra" não é representativa pelo que não pretendo sugerir qualquer tipo de extrapolação.
Ao longo do ano lectivo que agora termina, acasos da vida conduziram-me a uma reaproximação do ensino, em particular, do ensino da Matemática. Através do contacto directo com um pequeno grupo de alunos de diferentes escolas da proximidade, e de vários graus de ensino (9º, 10º e 12º), fiquei estarrecido com a iliteracia demonstrada. Desde logo, com o domínio muito incipiente da língua materna que em muito dificultava, quando não impossibilitava, a compreensão de um enunciado. "Isto é para fazer o quê?", "Estou baralhado" ou o mais sincero "Não percebo" foram expressões frequentes. À pergunta relativa a uma qualquer definição lá vinha a inevitável resposta (???) "É quando...". Depois, a dependência da máquina de calcular que constatei foi algo de absolutamente doentio e criminoso particularmente no ensino básico. A promoção da sua utilização apenas serve para tentar protelar a emergência da verdade: a ausência de competências de cálculo mental, incapacidade de aferir um resultado, desconhecimento das operações numéricas e algébricas elementares e por aí fora. Uma galeria de horrores que por várias vezes me fez lembrar a "crónica" de Olavo de Carvalho justamente intitulada A Imbecilização Desde a Infância.
O exame, qualquer exame, é um momento definidor do sucesso/insucesso, do "passei"/"chumbei", do "consegui" do "não consegui" (namorado/namorada, homem/mulher, emprego/desemprego, etc.). Perturbar terceiros num momento desta natureza ainda por cima invocando que a greve também era por eles ("em defesa do ensino"), por motivos afinal puramente corporativistas, é inqualificável.
Quando à substância - para que serve um sistema de ensino -, isto basta:
A Associação de Professores de Matemática chumba exame do 12.º ano. "Um aluno médio terá certamente muitas dificuldades na resolução desta prova".
Matemáticos [da Sociedade Portuguesa de Matemática] aplaudem prova A (do 12º Ano). "Verifica-se que a distribuição do nível de dificuldade das várias questões permite a distinção dos bons alunos, possibilitando também que o aluno médio, que se tenha preparado devidamente, obtenha uma classificação que reflicta adequadamente o seu nível de conhecimentos".
Está na altura de fechar a meditação. Boa noite.
quarta-feira, 26 de junho de 2013
Pífio e esquizofrénico acto de fé
Itália adia aumento do IVA e anuncia incentivos fiscais de 1,5 mil milhões à contratação de jovens no que constitui "uma mensagem para os consumidores, na esperança de que [a medida o adiamento] ajude a economia", afirmou o primeiro-ministro italiano Letta.
De quantos avisos precisaremos?
Questiona-se Mary Theroux, após as sucessivas revelações de Edward Snowden, que, em boa verdade, eram em parte já conhecidas graças à coragem de outros whistleblowers no passado recente. Theroux destaca a seguinte passagem da intervenção de Thomas Drake (na mesa redonda em que participou, cujo vídeo e transcrição completa está acessível aqui), que trabalhou para a NSA durante 12 anos e foi mesmo seu empregado por sete anos:
"O governo libertou-se das correntes que o prendiam à Constituição em resultado do 11 de Setembro. E no segredo absoluto dos gabinetes, aos mais altos níveis do estado, e com o selo de aprovação da Casa Branca, a NSA tornou-se no agente executivo de um programa de vigilância que efectivamente transformou os Estados Unidos da América, no equivalente a uma nação estrangeira para efeitos de vigilância electrónica através da técnica da "pesca de arrasto". (...)
E estamos a assistir aos esboços iniciais e aos contornos de um muito sistemático e amplo estado de vigilância leviatão, boa parte dele constituindo uma violação das bases fundamentais do nosso próprio país - na realidade, a mesma razão que nos levou à própria Revolução Americana . E a Quarta Emenda, para todos os fins e propósitos, foi revogada após o 9 de Setembro."
Pergunta Theroux: "Se isto não constitui razão suficiente para revogar o PATRIOT Act [link], a NDAA [link], as ordens executivas de Bush e de Obama, e todas e cada uma das actividades das agências que elas [leis] permitem, o que será preciso?" (Vídeo e transcrição do debate provenientes daqui, de que aconselho a leitura integral).
Ao centro, da esquerda para a direita, William Binney, Thomas Drake, J. Kirk Wieber antigos altos responsáveisda NSA com uma experiência conjunta de mais de 100 anos na comunidade dos serviços de informações (clicar na imagem para aceder ao vídeo)
O voo de Snowden para a liberdade
Jeffrey Tucker assina um belo texto - Snowden’s Flight to Freedom. Espero não o ter desfigurado excessivamente. Edward Snowden, como Bradley Manning e outros whistleblowers não o mereceriam.
Caro resto do mundo: por favor saiba o quão doloroso é para nós americanos ver o que está a acontecer no caso de Edward Snowden.
Edward Snowden
Ei-lo voando de Hong Kong para a Rússia - países que parecem constituir refúgios do longo braço do império dos EUA. Onde acabará ele? Pode ser a Islândia, a Venezuela ou o Equador. Ele precisa de ir para um lugar onde as autoridades não possam ser intimadas a entregá-lo aos seus carcereiros e possíveis executores.
Ou isso ou arriscar enfrentar a cadeira eléctrica por ter feito o que era correcto. Embora eu compreenda a corrupção do sistema - e quão más as coisas realmente estão - não deixa de ser difícil de "processar". A lei segundo a qual ele foi acusado data de 1917, e o seu único propósito era destruir o movimento pacifista da época. Como Woodrow Wilson disse antes de a lei ter sido aprovada, "Criaturas de paixões, a deslealdade e a anarquia devem ser esmagadas".
E foram. Se alguém se manifestava contra a guerra, era preso. Os jornais foram efectivamente nacionalizados. Os preços foram controlados. Os pensadores independentes de todo o tipo foram presos. Na verdade, à época, um número de norte-americanos fugiu para a Rússia em busca da liberdade para se verem em plena Revolução Bolchevique. Então, como agora, a escolha foi entre a frigideira ou o fogo.
Sim, é verdade, sabemos que a América não tem sido ela própria de há muito tempo. Talvez nunca o tenha sido. Mas, ainda assim, lemos os Federalist Papers ["O Federalista"]. Lemos Thomas Jefferson. Lemos a Declaração [de Independência], a Constituição, as palavras de Madison e de Paine. Nós simplesmente não podemos afastar a ideia de que há algo nesta noção de que o estado tem de ser limitado e que as pessoas têm o direito à liberdade.
terça-feira, 25 de junho de 2013
Mal posso esperar por Daniel Oliveira e Basílio Horta
Isabel Moreira adere ao PS. "Seguro disse-me: bem-vinda à família"
É sempre com alguma comoção que se assiste às reunificações de famílias desavindas.
Citação do dia (121)
"A melhor forma de conseguir o controlo sobre um povo e de o controlar totalmente passa por retirar um pouco da sua liberdade de cada vez, erodindo os direitos das pessoas através de milhares de pequenas e quase imperceptíveis restrições. Desta forma, as pessoas não irão dar conta desse processo de destruição de direitos e liberdades até que se atinja o ponto em que essas mudanças já não poderão ser revertidas."
atribuída a Adolph Hitler
Depois do QE3, o quê?
Detlev Sclichter não acredita (como também, entre outros, Peter Schiff) que exista uma estratégia de saída da "flexibilização quantitativa" (QE) por parte do Fed (como outros bancos centrais - Reino Unido, Suíça, Japão e sim, também o BCE). No artigo abaixo, explica porquê e creio que com argumentos bem convincentes. Daí que o que é de esperar é a continuação de mais do mesmo, ou seja, mais QE. Como cunhou Schiff, o mais provável será "QE To Infinity And Beyond".
Não custa perceber que assim seja: quem quer que tenha tido de lidar com uma sítuação de vício profundo, sabe não há verdadeira saída que não passe pelo corte abrupto da ingestão da droga. É muito doloroso o desmame abrupto mas é também simultâneamente o de mais rápida recuperação (e maior probabilidade de sucesso). Bernanke já está de saída pelo que será o seu sucessor que terá de lidar com os cacos provenientes da acção do "Helicopter Ben". A tradução, como habitualmente, é minha.
Um nova previsão está a alastrar nos mercados financeiros como se de um vírus se tratasse: o Fed está prestes a fechar a torneira monetária. O Impressor-em-Chefe dos EUA, o general Ben Bernanke, anunciou que poderia começar a reduzir o programa mensal de monetização da dívida, denominado de "quantitative easing" (QE), já no Outono de 2013, e talvez até terminando-o na totalidade em meados do próximo ano. Ele assegurou os mercados que o Fed iria manter a taxa de juro directora (a taxa dos Fed Funds) próxima de zero, pelo menos até 2015. Ainda assim, o fim do QE é visto como o início do fim da política [monetária] super-expansionista e, potencialmente, o primeiro passo no sentido da normalização, como se alguém ainda tivesse alguma ideia do que "normal" significasse.
Temendo que o fluxo do nutritivo leite materno do Fed pudesse secar, uma Wall Street resolutamente não desmamada teve um chilique e entrou em pânico.
Detlev Schlichter
Até aqui, tudo bem. Há apenas um único problema: isso não irá acontecer.
É certo que eu sou o primeiro a declarar que o Fed DEVERIA abolir o QE, e não apenas no Outono deste ano ou no Verão do próximo, mas agora. Agora mesmo. Porquê? Porque uma política de QE e de taxas de juro zero é uma loucura completa. Ela distorce os mercados, sabota a liquidação dos desequilíbrios, proíbe o correcto apreçamento do risco, e incentiva a acumulação de dívida. Ela entorpece os poderes curativos do mercado ao permitir a continuação do "fingir e expandir" na indústria financeira - e acrescenta novos desequilíbrios aos anteriores que ela também ajuda a manter.
Esta política pode ter impedido - por enquanto - a deflação da dívida [ligada ao endividamento], mas talvez a deflação da dívida seja aquilo que é necessário.
O QE não é senão uma massiva intervenção no mercado. É destrutivo. Não resolve os problemas subjacentes criando ao invés novos problemas.
segunda-feira, 24 de junho de 2013
Marianne Faithfull & Bill Frisell - As Tears Go By (2013)
Passaram-se 48 anos depois deste belíssimo momento. Não obstante, a versão cantada, ontem mesmo em Londres, com acompanhamento musical por Bill Frisell, é muito, muito especial. Uma boa semana!
domingo, 23 de junho de 2013
Tenebrosos malefícios da concorrência e da desregulação
Michael O'Leary, o CEO da Ryanair, anunciou há dias que a companhia aérea low-cost que dirige, vai adquirir 175 novos aviões. Não esconde a motivação porque o faz: pretende "fazer uma fortuna" com essa frota. Até aqui nada de novo, apesar da estranhíssima, incompreensível e inexplicável ausência de "estímulos" estatais na tomada da sua decisão (à parte o levantamento de restrições de operação comercial aérea).
E não é mesmo que o homem está a pensar "fazer uma fortuna" e, em simultâneo, proporcionando bilhetes a preços que estima vir a começar nos 10 dólares/euros (!), ligando cidades europeias com cidades americanas?
Maldita desregulação. Maldita!
sábado, 22 de junho de 2013
Eis os economistas que explicaram cada uma das crises no último século (não, Krugman não é um deles)
Pierre-Guy Veer assina Meet the Economists Who Have Explained Every Crisis Of the Last Century (No, Krugman Isn't One Of Them), um despretensioso mas a meu ver bem elegante e conciso artigo sobre a interpretação "austríaca" da crise que que se iniciou em 2008 (e que ainda persiste) bem como as crises precedentes dos últimos cem anos. O foco de atenção dirige-se, naturalmente, para o sistema monetário fiat em que vivemos, manipulado a bel-prazer por governos e bancos centrais, bem como para o vigente sistema bancário de reservas fraccionárias.
Uma das críticas recorrentes aos economistas do mainstream é que eles estão permanentemente a "errar as previsões" (e não é só Vítor Gaspar, ou o FMI...). Claro que erram, mas não porque não saibam fazer contas. Essa é uma crítica que passa muito longe do alvo. O que na realidade se passa é que os "erros" são inevitáveis pois é impossível subsumir os milhões de milhões de decisões que todos os dias são tomadas pelas pessoas, seja no plano individual seja nos diferentes planos de interacção humana (família, emprego, amigos, vizinhança, etc.), e que a única coisa certa é que elas serão diferentes das do dia seguinte (ad infinitum). Por definição, o ser humano é imprevisível. As pessoas não são pedras. Nem, felizmente, robots. Por isso, todos aqueles que reclamam o estatuto de ciência para a disciplina de Economia, tendo a Física por referência - onde, aí sim, os fenómenos se podem prever - estão destinados a um inapelável e rotundo fracasso. Isso não significa que não possa haver, como há, a identificação de padrões que possibilitem maiores ou menores graus de previsibilidade. (Peter Schiff, um "austríaco" com um excelente registo preditivo, faz aqui o que é a meu ver um excelente exercício. A conclusão a que chega, que subscrevo, leva-o a aconselhar os seus leitores a "pôr o cinto" - a turbulência que aí vem vai ser muito severa.)
A tradução é da minha responsabilidade como é minha a autoria do roubo do título do post.
Uma das críticas recorrentes aos economistas do mainstream é que eles estão permanentemente a "errar as previsões" (e não é só Vítor Gaspar, ou o FMI...). Claro que erram, mas não porque não saibam fazer contas. Essa é uma crítica que passa muito longe do alvo. O que na realidade se passa é que os "erros" são inevitáveis pois é impossível subsumir os milhões de milhões de decisões que todos os dias são tomadas pelas pessoas, seja no plano individual seja nos diferentes planos de interacção humana (família, emprego, amigos, vizinhança, etc.), e que a única coisa certa é que elas serão diferentes das do dia seguinte (ad infinitum). Por definição, o ser humano é imprevisível. As pessoas não são pedras. Nem, felizmente, robots. Por isso, todos aqueles que reclamam o estatuto de ciência para a disciplina de Economia, tendo a Física por referência - onde, aí sim, os fenómenos se podem prever - estão destinados a um inapelável e rotundo fracasso. Isso não significa que não possa haver, como há, a identificação de padrões que possibilitem maiores ou menores graus de previsibilidade. (Peter Schiff, um "austríaco" com um excelente registo preditivo, faz aqui o que é a meu ver um excelente exercício. A conclusão a que chega, que subscrevo, leva-o a aconselhar os seus leitores a "pôr o cinto" - a turbulência que aí vem vai ser muito severa.)
A tradução é da minha responsabilidade como é minha a autoria do roubo do título do post.
Muitas pessoas ainda acreditam que o lamaçal económico em que estamos atolados era imprevisível ou, então, causada pela desregulamentação massiva - apesar do facto de que a actividade estatal nunca ter realmente diminuído. São falsas ambas as afirmações. Cada uma das crises económicas dos últimos 100 anos era previsível (por vezes também prevista) foi causada pela intervenção estatal na economia.
Na verdade, parece que algumas pessoas, em 2013, começaram a compreendê-lo. O Dr. Emanuele Canegrati, economista sénior junto do Parlamento italiano, foi mesmo ao ponto de dizer que Ludwig von Mises, o já falecido economista americano natural da Áustria, e a sua Escola Austríaca de economia tinham razão quando defendiam a sua teoria sobre os ciclos económicos e a inflação.
Ludwig von Mises
Que teoria é essa? Apesar do que os keynesianos como Paul Krugman afirmam, a escola austríaca de economia não é um culto. É uma ciência séria que se baseia na praxeologia, ou seja, no estudo da acção humana e da escolha. Ao contrário dos átomos ou dos animais em laboratórios, é quase impossível estudar as acções dos seres humanos num ambiente experimental, uma vez que é quase impossível observar condições ceteris paribus (mantendo tudo o resto constante). Consequentemente, a praxeologia só pode analisar os efeitos, não as motivações, do comportamento humano. Não obstante, ela vai bem longe na explicação das teorias da Escola Austríaca.
sexta-feira, 21 de junho de 2013
Citação do dia (120)
"A segurança perfeita não constitui o objectivo do estado. O que pretendemos do estado é que faça valer a lei para proteger as nossas liberdades. O estado não precisa saber mais sobre o que nós fazemos. Somos nós que precisamos saber mais sobre o que o estado está a fazer. Necessitamos virar as câmaras na direcção da polícia e do estado, e não o contrário. Devemos estar gratos por autores como Glenn Greenwald, que divulgou a história da semana passada, estarem dispostos a correr riscos para nos informar sobre o que está a fazer o estado. Há apelos para a perseguição a Greenwald e aos outros denunciadores e jornalistas. Eles devem ser defendidos, pois o seu trabalho defende a nossa liberdade."
Ron Paul
Niall Ferguson: Os Estados Regulados da America
Tenho vindo ultimamente a abordar algumas das questões ligadas à matéria da "regulação", para concluir invariavelmente pelo seu carácter pernicioso para o bem-estar e prosperidade das pessoas (no sentido amplo de colectividade não limitada a grupos de interesses específicos). Digo isto muito embora não me custe aceitar que muitas das vezes os resultados são os opostos daqueles que os seus proponentes, de boa fé, esperariam/gostariam. Daí que se viva permanentemente num afadigar extenuante e histriónico de "reforma" sobre "reforma", em que cada remédio nada mais faça que piorar o estado do paciente.
É realmente frustrante saber que a terapia correcta passa por menos e não mais "medicamentos" (a retirar na totalidade até que termine o desmame) e assistir ao desvario de tudo querer regulamentar, dificultar e proibir. Mas muito melhor que eu, as pinceladas de Niall Ferguson sobre a "nação regulação", para o qual convocou o genial e profético Tocqueville, num seu artigo recente no Wall Street Journal (cujo título roubei para título deste post), ilustram e substituem um post que pensei fazer sobre este documento. De novo, a responsabilidade pela tradução de mais um artigo é minha exceptuando os trechos citados de "Da Democracia na América" onde me socorri da tradução portuguesa de Miguel Serras Pereira, numa edição da Relógio D'água.
Em "Da Democracia na América", publicado em 1833, Alexis de Tocqueville maravilhava-se com a forma como os americanos preferiam a associação voluntária à regulamentação governamental. "O habitante dos Estados Unidos", escrevia, "não lança à autoridade social mais do um olhar desconfiado e inquieto, e só recorre ao seu poder quando não pode dispensá-lo."
Niall Ferguson
Ao contrário dos franceses, continuava, que instintivamente olhavam para o Estado para proporcionar ordem social e económica, os americanos contavam com os seus próprios esforços. "Nos Estados Unidos os indivíduos associam-se com propósitos de segurança pública, de comércio e de indústria, de moral e de religião. Nada há que a vontade humana desespere de alcançar através da acção livre do poder colectivo dos indivíduos."
O que especialmente espantava Tocqueville era a variedade de organizações não-governamentais que os americanos formavam: "Não só têm associações comerciais e industriais (...) mas têm-nas ainda de mil outras espécies: religiosas, morais, graves, fúteis, bastante gerais e muito particulares, imensas e bastante pequenas; os americanos associam-se para dar festas, fundar seminários, construir estalagens, erguer igrejas, difundir livros, enviar missionários para os antípodas; eles criam assim hospitais, prisões, escolas."
Tocqueville não reconheceria a América de hoje. Na verdade, tão completo foi o colapso da vida associativa, e tão enorme foi o crescimento do estado que ele seria forçado a concluir que, em algum ponto entre 1833 e 2013, a França deve ter conquistado os Estados Unidos.
O declínio da vida associativa americana foi memoravelmente documentado em 1995, no ensaio seminal de Robert Puttnam, intitulado "Bowling Alone", que documentou o êxodo dos norte-americanos dos campeonatos de bowling, dos clubes rotários e similares. Desde então, a tendência descendente do "capital social" tem continuado. De acordo com o World Values Survey 2006, a participação activa, até mesmo de associações religiosas, diminuiu de pouco mais de metade da população para pouco mais de um terço (37%). A proporção de americanos que são membros activos de associações culturais caiu de 24% para 14%; quanto às associações profissionais, os números são agora de apenas 12%, que comparam com mais de um quinto em 1995. E, não, o Facebook não constitui um seu substituto.
Em vez de se juntarem para conseguir fazer o que é preciso, os americanos tornaram-se cada vez mais dependentes de Washington. Na política externa, ainda poderá ser verdade que os americanos são de Marte e os europeus de Vénus. Mas quando se trata de política interna, todos vimos agora do mesmo lugar: do Planeta Estado.
quinta-feira, 20 de junho de 2013
Revisitando o fim do ensino técnico
No Porta da Loja propõe-se uma revisitação (muito bem documentada, como sempre nos habituou o seu editor) aos tempos já recuados em que, por sentença sumária, o então denominado Ensino Técnico foi, esse sim, implodido (ao contrário do que sucedeu com a "promessa" de um pusilânime ministro). Recomendo vivamente uma visita até lá (tanto mais proveitosa quanto maior tempo e atenção se lhe puder dedicar).
A tese, a que não custa aderir, é a de que terá sido o PCP o responsável por lavrar e executar a sentença, sendo que actor central nesse drama nessa trama teria sido o já falecido pedagogo e governante Rui Grácio (indubitavelmente coerente nesta matéria no "antes" e no "depois"). Ainda não há um ano, ainda que de forma mais breve e oblíqua e sem recorrer a personalizações, o Prof. Carlos Fiolhais, em artigo publicado no Público e reproduzido no blogue Rerum Natura, sob o título Uma herança do PREC, atribuía àqueles conturbados tempos (e portanto aos responsáveis da altura) a situação de descalabro a que a massificação escolar unitária - e em consequência embrutecedora para os mais desfavorecidos - inevitavelmente nos conduziu.
Dito isto, porém, há que que lembrar (pelo menos) dois marcos anteriores ao 25 de Abril.
O primeiro está vertido no Decreto-Lei 47480, de 2 de Janeiro de 1967, era ministro da Educação Inocêncio Galvão Teles (e António de Oliveira Salazar ainda não tinha caído da cadeira), que institui o 1º ciclo do ensino unificado fundindo o então 1º ciclo do ensino liceal com o até aí vigente ciclo preparatório do ensino técnico. (Por sinal, fui um dos integrou o contingente inicial, corria o ano lectivo de 1968/69). Vale a pena ler o longo preâmbulo do diploma.
O segundo é, evidentemente, a Lei 5/73, de 25 de Julho, já sob o consulado do "moderado" Veiga Simão, era Marcello Caetano Presidente do Conselho (onde se mantinha desde que o antecessor caíra da sobredita). Embora esta fosse uma Lei de Bases e, portanto, carecedora de legislação complementar para a concretizar, ela é, não obstante, de leitura imprescindível porque é à sua luz que melhor se pode compreender o que sucedeu no pós 25 de Abril. Com efeito, nela se previa a instituição de um "ensino básico", compulsório, composto pelo "ensino primário" e pelo "ensino preparatório", cada um deles com uma duração de quatro anos. Dito de outra forma, a ideia era alargar o "ensino unificado" (sinónimo de obrigatório) entre os alunos entre os 6-12 anos, como definido seis anos antes, para os 6-14 anos. Assim, em consequência, a componente "técnica" do ensino seria adiada pelo menos de dois ano face à anterior reforma. Mas a leitura da Base IX, referente ao ensino secundário, de duração igualmente prevista de quatro anos, permite uma leitura retrospectiva de que o Ensino Técnico, tal como os menos novos o conheceram, teria os anos contados (para além de conformar o ensino não superior aos 12 anos de escolaridade (o ocorreria no ano lectivo de 1978-1979). O que duvido, ao contrário de outros, é que a sua morte fosse inevitável por inadequação funcional, relativamente ao mercado de trabalho, com o país de então (como de resto, com o de agora). Antes suspeito que foi cuidadosamente premeditada (e bem antes do reviralho).
Dito isto, porém, há que que lembrar (pelo menos) dois marcos anteriores ao 25 de Abril.
O primeiro está vertido no Decreto-Lei 47480, de 2 de Janeiro de 1967, era ministro da Educação Inocêncio Galvão Teles (e António de Oliveira Salazar ainda não tinha caído da cadeira), que institui o 1º ciclo do ensino unificado fundindo o então 1º ciclo do ensino liceal com o até aí vigente ciclo preparatório do ensino técnico. (Por sinal, fui um dos integrou o contingente inicial, corria o ano lectivo de 1968/69). Vale a pena ler o longo preâmbulo do diploma.
O segundo é, evidentemente, a Lei 5/73, de 25 de Julho, já sob o consulado do "moderado" Veiga Simão, era Marcello Caetano Presidente do Conselho (onde se mantinha desde que o antecessor caíra da sobredita). Embora esta fosse uma Lei de Bases e, portanto, carecedora de legislação complementar para a concretizar, ela é, não obstante, de leitura imprescindível porque é à sua luz que melhor se pode compreender o que sucedeu no pós 25 de Abril. Com efeito, nela se previa a instituição de um "ensino básico", compulsório, composto pelo "ensino primário" e pelo "ensino preparatório", cada um deles com uma duração de quatro anos. Dito de outra forma, a ideia era alargar o "ensino unificado" (sinónimo de obrigatório) entre os alunos entre os 6-12 anos, como definido seis anos antes, para os 6-14 anos. Assim, em consequência, a componente "técnica" do ensino seria adiada pelo menos de dois ano face à anterior reforma. Mas a leitura da Base IX, referente ao ensino secundário, de duração igualmente prevista de quatro anos, permite uma leitura retrospectiva de que o Ensino Técnico, tal como os menos novos o conheceram, teria os anos contados (para além de conformar o ensino não superior aos 12 anos de escolaridade (o ocorreria no ano lectivo de 1978-1979). O que duvido, ao contrário de outros, é que a sua morte fosse inevitável por inadequação funcional, relativamente ao mercado de trabalho, com o país de então (como de resto, com o de agora). Antes suspeito que foi cuidadosamente premeditada (e bem antes do reviralho).
O atoleiro sírio
Não bastando isto:
Temos agora mais isto, por "cortesia" de Obama (mas também de Cameron e Hollande):
Temos agora mais isto, por "cortesia" de Obama (mas também de Cameron e Hollande):
A escalada da tragédia síria
Obama Escalates Syria’s Civil War é o título de mais um dos lúcidos artigos de Patrick J. Buchanan contra a tentação (e a prática) imperial dos EUA que resultou da instalação dos neocons nos corredores do poder. Não há - e de há muito que sabe ser assim - qualquer diferença na política externa (e interna) de Obama face à de George W. Bush. Só palas partidárias e uma cegueira e surdez incuráveis podem impedir esse reconhecimento (veja-se, por exemplo, esta notícia de ontem, esta outra de há uns dias ou ainda esta, em versão "animal feroz" na ausência de teleponto).
A "guerra ao terror" de Bush (na realidade, começada ainda por Clinton no Afeganistão) deu nisto: US drops demand Taliban renounce al-Qaeda to allow talks to progress e Afeganistão rompe negociações com os Estados Unidos. Não admira que Obama não se preocupe com a presença em força de terroristas entre os rebeldes que decidiu agora (como antes na Líbia) ajudar directamente com armas. Em nome de quê? Em nome de quê? Ou será que alguém acredita nisto? Se há, que reflicta nesta asserção famposa de Benjamin Franklin: "Those who would give up essential liberty to purchase a little temporary safety deserve neither liberty nor safety."
A tradução, algo livre, do artigo de Pat Buchanan é da minha responsabilidade.
Barack Obama acaba de dar os seus primeiros passos numa guerra na Síria que podem definir e destruir a sua presidência.
Na quinta-feira, enquanto festejava com os foliões LGBT o Mês do Orgulho Gay, um funcionário, Ben Rhodes, informou a imprensa na Casa Branca que irão ser fornecidas aos rebeldes sírios armas americanas.
Durante dois anos, Obama manteve-se fora desta guerra sectária/civil que já consumiu 90 mil vidas. Por que está entrando nela agora?
A Casa Branca alega ter agora provas que Bashar Assad usou gás sarin para matar 100-150 pessoas, desta forma ultrapassando uma "linha vermelha" que Obama tinha estabelecido como factor de "mudança de jogo". Desafiado, com a credibilidade contestada, ele tinha que fazer alguma.
No entanto, a alegada utilização por Assad de gás sarin para justificar a intervenção dos EUA, mais parece constituir um pretexto para entrar na guerra que uma racionalização para nela participar.
Porque a Casa Branca decidira intervir semanas atrás, antes da utilização do gás sarin ter sido confirmada. E por que razão teria Assad usado apenas minúsculos vestígios? Onde está a evidência fotográfica dos mortos desfigurados?
Que provas temos de que não foram os rebeldes que forjaram a utilização de gás sarin ou que o usaram eles próprios para conseguir que os crédulos americanos entrassem na sua guerra?
E todavia, por que razão o Presidente Obama, cuja orgulhosa jactância assenta na promessa de que ele nos irá desemaranhar das guerras do Afeganistão e do Iraque, tal como Dwight Eisenhower com a Guerra da Coreia, iria mergulhar-nos numa nova guerra?
Ele tem estado sob severa pressão política e internacional para fazer algo depois de Assad e o Hezbollah terem recapturado a cidade estratégica de Qusair e começado a preparar-se para recapturar Aleppo, a maior cidade.
Caso Assad tenha sucesso, isso significaria uma derrota decisiva para os rebeldes e seus apoiantes: os turcos, os sauditas e qataris. E isso significaria uma vitória geoestratégica para o Irão, o Hezbollah e a Rússia, que provaram constituir aliados confiáveis.
Para evitar essa derrota e humilhação, vamos agora enviar armas e munições para manter o controlo dos rebeldes sobre território suficiente para negociar uma paz que venha a remover Assad.
Sem ponta de senso
Do portal do Governo (`datado de ontem, 19 de Junho, às 16:03): "O Secretário de Estado da Energia, Artur Trindade, entregou no Parlamento o anteprojeto legislativo para o fornecimento de combustíveis de baixo custo nos postos de abastecimento com mais de quatro reservatórios ou que disponham de oito ou mais locais de provisão."
Não, não estou a protestar contra a mutilação que sofreu a palavra anteprojecto neste texto. Protesto sim contra o intervencionismo estatista e imbecil que, evidentemente, já está a abrir portas de oportunidade de calibre como este: Combustíveis "low cost" poderão ser fonte de receita para municípios. Isto é mais ao menos o mesmo que estipular que cada talho de supermercado, que venda lombo, acém e alcatra tem, obrigatoriamente, de igualmente disponibilizar bofe para satisfazer os clientes menos abastados. Logo a seguir à fixação da tabela de coimas, arranjam-se umas brigadas fiscalizadoras (há que combater o desemprego pois claro) e ainda se conclui, como defendia um antigo governador civil, que semelhante actividade (de fiscalização) até dá lucro!
Há muito que defendo a pura e simples extinção do ministério da Economia sendo este apenas mais um exemplo que aduzo para justificá-la. Mesmo quando no governo está uma maioria ultra-neo-liberal (ou especialmente quando tal acontece...).
Há muito que defendo a pura e simples extinção do ministério da Economia sendo este apenas mais um exemplo que aduzo para justificá-la. Mesmo quando no governo está uma maioria ultra-neo-liberal (ou especialmente quando tal acontece...).
terça-feira, 18 de junho de 2013
De Bush a Obama, do Iraque à Síria: intervencionismo fútil e destruidor
Ron Paul já não é membro da Câmara dos Representantes mas continua a manter uma presença cívica notável, nomeadamente e quanto a questões de política externa, através do novel Instituto para a Paz e Prosperidade a que empresta o seu nome. Nesse âmbito, anteontem, Ron Paul produziu uma declaração pública a propósito da decisão de Obama de fornecer, oficialmente, armas aos rebeldes sírios. A Síria é um atoleiro, como talvez até Recep Erdogan já terá compreendido. Outros só o compreenderão quando o desastre assumir proporções ainda mais calamitosas e finalmente se derem conta - mais uma vez - da futilidade da intervenção externa (apesar da propaganda que alguns títulos tentam transparecer). A tradução do texto é minha.
O presidente Obama anunciou na semana passada que a "comunidade" dos serviços de informações dos EUA acabara de estabelecer que o governo sírio usou gás venenoso em pequena escala assim matando cerca de 100 pessoas numa guerra civil que já levou à perda de cerca de 100 mil vidas. Devido a esta utilização de gás, alegou o presidente, a Síria havia cruzado a "linha vermelha" e, como tal, os EUA têm de começar a armar os rebeldes que lutam pelo derrube do governo sírio.
Deixando de lado a questão do porquê de 100 mortos por meio de gás serem algo mais importantes do que os 99900 mortos por outros meios, a verdade é que a sua explicação tem tantos furos quanto um passador. O Washington Post noticiou esta semana que a decisão de, publicamente, fornecer armas aos rebeldes sírios foi tomada "há semanas atrás". Por outras palavras, foi tomada num momento em que a comunidade dos serviços de informações não acreditava, "com um alto grau de confiança", que o governo sírio tivesse usado armas químicas.
Mais: este plano de cedência de armas aos rebeldes sírios tornara-se a política adoptada muito mais cedo que isso, como noticiava o Washington Post informando que a CIA havia expandido ao longo do ano passado as suas bases secretas na Jordânia para preparar a transferência de armas para os rebeldes na Síria.
domingo, 16 de junho de 2013
Citação do dia (119)
"Wherever violence is used against civilized humanity, you will find intellectuals by the dozens collaborating and further brandishing their ideological reasons for doing so. This is not about a crisis of or helplessness on the part of the intelligentsia, rather it is about a silent – or else extremely active – complicity in the moral and political shambles of Europe today. (...) Have you ever known anything too horrible, too murderous or too nonsensical for an intellectual not to want to seize on it for the purpose of regenerating the world?"
sábado, 15 de junho de 2013
França: num beco sem saída?
Num célebre discurso pronunciado em Londres durante o exílio, a 1 de Março de 1941, Charles De Gaulle, aquele que viria a ser presidente da França durante 10 anos, depois de ter liderado o processo que conduziria à formação da V República, diria: "Il y a un pacte vingt fois séculaire entre la grandeur de la France et la liberté du monde." Esta auto-atribuída missão, assumida pelos sucessivos dirigentes máximos franceses, de "distribuir" a liberdade pelo mundo ao mesmo tempo que perseguiam "la grandeur", remonta a Napoleão e, portanto, à revolução de 1789. Sucede que, desde Waterloo, "la grandeur" se vem progressivamente reduzindo a uma recordação do passado ainda que, de quando em vez disfarçada pela inauguração de um "Beaubourg", de uma pirâmide, de um museu ou de um novo "Arco" na capital do Hexágono. A já secular hipertrofia estatista francesa exacerbou-se durante os 14 anos de François Miterrand e os incapazes Chirac e Sarkozy que lhe sucederam pouco mais fizeram que gerir o legado. Deste modo, a herança que François Hollande recebeu era bem pesada, mas o ano que passou em nada a aliviou. Pelo contrário.
Foto retirada daqui |
David Howden and Jacques Briam, em France’s Cul-De-Sac, percorrem as medidas económicas tomadas por Hollande no primeiro ano do seu mandato e explicam por que razão elas não apenas não são adequadas como, pelo contrário, agravam a já difícil situação do paciente. Em particular, notam a ironia de o país mais entusiasta da criação do euro ser agora "vítima" da moeda única, ao não querer ajustar-se às restrições que decorreriam do passo tomado. Terminam o artigo enunciando as linhas de política necessárias ao retorno do crescimento económico saudável. A tradução, como habitualmente, é da minha responsabilidade.
Há aproximadamente um ano atrás, em plena crise económica, François Hollande comemorou a sua vitória sobre Nicolas Sarkozy nas eleições presidenciais francesas. Hollande tornou-se no líder de um país sob forte turbulência económica. Durante o ano que passou, ele teve rédea relativamente livre para levar a cabo a sua agenda económica, uma vez que o Partido Socialista que lidera tem a maioria no parlamento francês.
A França tem uma história de despesa estatal grandiosa, mesmo se avaliada pelos padrões europeus. A despesa pública ascende a 57% do produto nacional enquanto a dívida pública representa mais de 90% do PIB. Embora a austeridade tenha sido a palavra da ordem na Europa desde 2009, daí resultando um modesto declínio da despesa pública em percentagem do PIB, a França não faz parte dessa tendência.
O sector público representa hoje quase dois terços toda a actividade económica directa (e até mais, se se incluir a actividade indirecta). Esta grande e crescente dependência do estado é desastrosa porque é financiada por impostos cada vez mais elevados. Estes altos impostos drenam o sector privado (e em simultâneo conferem ao sector público uma aura de impotência) e a despesa sob défice [financiada através de empréstimos] obriga as futuras gerações de cidadãos franceses a pagar a generosidade do governo de hoje.
Profundamente embrenhada na psique francesa está a ideia de que cortes no gigantesco sector público causariam sérios danos a todos. Esta incapacidade de imaginar uma economia francesa onde o sector privado preenchesse o espaço deixado livre por uma menor prestação de serviços públicos, reforçou a relutância dos políticos e, em particular, de François Hollande, para recorrer a medidas de austeridade para ultrapassar a crise. Em vez disso, a solução actual consiste em aumentar a despesa do estado e em criar mais postos de trabalho no sector público. Dessa forma, a administração de Hollande prometeu aumentar o salário mínimo para todos os trabalhadores, públicos e privados, e criar 60 mil novos empregos para professores.
sexta-feira, 14 de junho de 2013
Mitos persistentes - A Igreja Católica inimiga da Ciência (legendado)
A excelente sugestão de um leitor, convido-vos a conhecer melhor o papel da Igreja Católica na construção da civilização ocidental. Este é o primeiro de 12 vídeos que Thomas Woods, o prolixo autor de, entre outros, O Que a Civilização Ocidental Deve à Igreja Católica (livro traduzido em português europeu, de onde derivaram os vídeos) e The Church and the Market: A Catholic Defense of the Free Economy (Studies in Ethics and Economics). Historiador e economista da Escola Austríaca, Thomas Woods é também um mestre na arte de comunicar pelo que foi um prazer percorrer os vídeos (que não conhecia).
quinta-feira, 13 de junho de 2013
O mundo funcionava razoavelmente até que os sinistros neoliberais tudo desregularam provocando a crise
Mais coisa menos bico, o título do post resume razoavelmente a "narrativa" habitual do discurso público, dos partidos políticos aos media do mainstream. É certo que há cambiantes mas, relativamente aos partidos do "arco de governação", há apenas isso. Pequenas cambiantes.
O que se passa entre nós não é muito diferente da situação da generalidade do mundo ocidental. Veja-se, por exemplo, o caso dos EUA que mantêm uma estatística desde 1936, quanto à actividade legislativa federal: novas leis e regulamentos federais (ou meras alterações à legislação/regulamentação existentes) incluindo também as propostas que não chegaram a tornar-se efectivas. Toda esta actividade é registada no Federal Register e, como se pode observar no gráfico seguinte (dados provenientes daqui), só sugere uma pergunta: mas afinal onde é que está visível a desregulamentação?
O que se passa entre nós não é muito diferente da situação da generalidade do mundo ocidental. Veja-se, por exemplo, o caso dos EUA que mantêm uma estatística desde 1936, quanto à actividade legislativa federal: novas leis e regulamentos federais (ou meras alterações à legislação/regulamentação existentes) incluindo também as propostas que não chegaram a tornar-se efectivas. Toda esta actividade é registada no Federal Register e, como se pode observar no gráfico seguinte (dados provenientes daqui), só sugere uma pergunta: mas afinal onde é que está visível a desregulamentação?
Ou dar-se-á o caso de o valor semântico da "desregulamentação" se ter alterado entretanto? Para investigar essa hipótese consultemos, por exemplo, o Merriam-Webster. Traduzo: "o acto ou processo de remover restrições e regulamentos". Hipótese infirmada, pois. Alguma sugestão dos leitores?
___________________________________________
Nota: alguns amigos fizeram-me notar a ausência, na opinião deles excessiva, de argumentação formal (matemática/simbólica) nos meus modestos escritos por aqui. Pois bem: desta vez levam com uma regressão linear (que gera a curva de tendência a laranja no gráfico). Agradecendo à nova versão do Excel, aproveito para acrescentar o "doce" da equação da recta bem como do R2 (o qual, rondando os 0.9, sugere uma forte correlação estatística, entre a mera passagem do tempo e a crescente regurgitação legislativa e regulamentar). E pronto, a estatística confirma o que os não-distraídos e que trabalham nas empresas há muito sabiam.
Palavras para quê? É um regulador a funcionar!
Tenho publicado alguns posts sob o título de "mitos persistentes". Tenciono continuar a fazê-lo (sobre temas de economia ou outros). Hoje, agora, e a propósito desta notícia, procurarei aflorar alguns aspectos elementares de um tópico gigantesco - a "regulação" - onde os mitos abundam e as terríveis consequências dos seus efeitos também.
Referia por aqui, há perto de ano e meio, o curioso fenómeno da falta recorrente de determinados nas farmácias devido à sua exportação "ilegal" (de que eu próprio sou "vítima"). O que se passava (e continua a passar) era algo de simples, ainda que talvez não intuitivo para muitos. Como não existe um mercado do medicamento (falo dos medicamentos comparticipados), os preços dos mesmos não são resultam do "encontro" entre a procura e a oferta dos mesmos. De facto, são preços burocráticos e, consequentemente, arbitrários (sim, sei que se tomam para referência na sua fixação os seus preços médios em outros países embora, também aí, os preços sejam administrativos). Não admira pois que, caso no mercado internacional for possível obter ao fabricante/grossista/retalhista preços mais favoráveis do que aqueles que consegue no país, uma parte da produção seja "desviada" para a exportação. Nada disto constitui rocket science. Simples funcionamento das leis da oferta e da procura. De efeitos previsíveis para quem não as ignore (ou as tente contrariar, assim como se se ensaiasse criar o vácuo para escapar à gravidade).
Reconhecendo por fim, pelo menos em parte, as consequências não intencionais das suas próprias acções, parece que o Infarmed pretende agora adoptar uma política de preços mínimos(!). Palavras para quê?
Referia por aqui, há perto de ano e meio, o curioso fenómeno da falta recorrente de determinados nas farmácias devido à sua exportação "ilegal" (de que eu próprio sou "vítima"). O que se passava (e continua a passar) era algo de simples, ainda que talvez não intuitivo para muitos. Como não existe um mercado do medicamento (falo dos medicamentos comparticipados), os preços dos mesmos não são resultam do "encontro" entre a procura e a oferta dos mesmos. De facto, são preços burocráticos e, consequentemente, arbitrários (sim, sei que se tomam para referência na sua fixação os seus preços médios em outros países embora, também aí, os preços sejam administrativos). Não admira pois que, caso no mercado internacional for possível obter ao fabricante/grossista/retalhista preços mais favoráveis do que aqueles que consegue no país, uma parte da produção seja "desviada" para a exportação. Nada disto constitui rocket science. Simples funcionamento das leis da oferta e da procura. De efeitos previsíveis para quem não as ignore (ou as tente contrariar, assim como se se ensaiasse criar o vácuo para escapar à gravidade).
Reconhecendo por fim, pelo menos em parte, as consequências não intencionais das suas próprias acções, parece que o Infarmed pretende agora adoptar uma política de preços mínimos(!). Palavras para quê?
Ilegalidades
Já todos tínhamos percebido que a realidade é inconstitucional.
Em complemento à douta jurisprudência do TC, ficamos agora a saber que não ter dinheiro na tesouraria é manifestamente ilegal.
M'espanto às vezes, muitas m'avergonho
O título do post remete para a epígrafe, algo modificada, escolhida pelo autor um dos mais conhecidos e antigos blogues lusitanos, por sua vez pedida emprestada a Sá de Miranda. A um e a outro o meu pedido de desculpas pela usurpação, mas não me ocorreu melhor para caracterizar a incensão que os media de "referência" dedicam aos últimos salvadores do mundo e arredores - os banqueiros centrais. Os tais que, mercê dos pactos faustianos que celebraram, praticam diariamente o exercício alquímico em quantidades colossais, assim permitindo que as grandes ilusões estatistas persistam por mais algum tempo, desta forma adiando o inevitável e agravando inexoravelmente as consequências das distorções introduzidas.
Montagem fotográfica do New York Times |
É interessantíssimo constatar como os media de "referência", invariavelmente devastadores para com as políticas de "austeridade", supostamente defendidas por tenebrosos ultra-neoliberais, e incessantes defensores das políticas de "estímulos", tenham uma tão grande estima pelos contributos/receitas de Milton Friedman no que toca à manipulação da massa monetária. Friedman que, em tempos ainda recentes, era apodado de "monetarista", um insulto então de "gravidade" equivalente ao do "neoliberalismo" dos dias de hoje. Poucos foram tão longe no elogio a Friedman como Ben Bernanke, actual presidente da Fed, quando, por ocasião do 90º aniversário do primeiro, a 8 de Novembro de 2002 disse publicamente: "I would like to say to Milton and Anna [Anna Schwartz, co-autora com Friedman da monumental A Monetary History of the United States]: Regarding the Great Depression. You're right, we [os banqueiros centrais] did it. We're very sorry. But thanks to you, we won't do it again.
Ainda me espanto às vezes (cada vez menos) pelo que creio, até ver, não me ter ainda transformado num cínico irremediável. Mas continuo a envergonhar-me com a insuportável mistura de iliteracia, indigência mental reiterada, relativismo e oportunismo de muitos (todos com "preocupações sociais"), em particular da imprensa de "referência", na realidade nada mais que agremiações activistas de profissão do estatismo.
Leitura complementar muito recomendada: Bank Of England's Haldane: "We've Intentionally Blown The Biggest Bond Bubble In History"
Leitura complementar muito recomendada: Bank Of England's Haldane: "We've Intentionally Blown The Biggest Bond Bubble In History"
Iliteracia doutoral
With Cigarettes Banned In Most Prisons, Gangs Shift From Drugs To Smokes.
Mas as "mentes brilhantes" estariam à espera do quê?
Mas as "mentes brilhantes" estariam à espera do quê?
quarta-feira, 12 de junho de 2013
A insensibilidade social da verdade
Ao longo de toda a minha vida, sempre recusei pertencer aos grupos de carpideiras profissionais muito próprios da "condição lusitana". Não obstante, a verdade é que não descortino razões algumas, por mais que me esforce, para ter algum optimismo quanto ao desenlace da crise económica e moral que atravessamos. Desgraçadamente, sendo o mundo da irracionalidade ou da emoção impermeáveis à razão, mesmo as pessoas letradas sustentam leituras da realidade que não têm qualquer correspondência com os factos mais elementares. O epíteto, nas versões mais amenas, de "insensibilidade social" ou, mais comummente, das visões "economicistas" (aqui os factos surpreenderam-me, sempre esperei pela abjuração "contabilística") dos problemas, desencoraja muita gente a discutir, com serenidade e seriedade, os gravíssimos problemas que temos pela frente e dos quais, como se escreve abaixo, e por muito que nos custe saber, "há ainda mais e pior".
É verdade que, entre nós, algumas vozes isoladas (para além da habitual) têm surgido a desvendar a verdade em alguns domínios onde já quase tudo está de facto às escâncaras. Noutras longitudes, o mesmo se vem passando. David Stockman é um das desassombradas vozes nos EUA que recentemente publicou o magnífico livro que continua a ocupar a vitrina lateral - The Great Deformation - em cuja leitura mergulhei já há umas semanas. O que se segue é um excerto desse livro publicado no Mises Institute sob o auto-explicativo título Social Security: The New Deal’s Fiscal Ponzi. Como referi acima e em outras ocasiões, não estou optimista. Creio, antes, que o tempo prestará o devido tributo a Gary North: só depois de termos atravessado o Rubicão do "Grande Incumprimento", a sanidade poderá regressar. A tradução, bem pobre quanto comparada à qualidade do texto original, é minha. Um bom fim-de-semana.
A lei da Segurança Social de 1935 não teve virtualmente nada a ver com o fim da depressão, e se algum efeito produziu foi um impacto contraccionista. As contribuições sociais sobre os salários começaram em 1937, enquanto os pagamentos regulares de benefícios apenas se iniciaram em 1940.
David Stockman
No entanto, o seu legado fiscal ameaça a catástrofe na presente era porque o seu princípio nuclear de "seguro social" dá inexoravelmente lugar a uma máquina fiscal apocalíptica. Quando, no contexto da democracia política moderna, o estado proporciona transferências universais aos seus cidadãos sem comprovação de necessidade, está dessa forma a promover a sua própria bancarrota - a prazo.
Ao invés, uma pequena parte da legislação de 1935 contemplava o princípio oposto, ou seja, a rede de segurança sob condição de recursos proporcionava auxílios diferenciados aos idosos de baixos rendimentos, aos invisuiais, deficientes e famílias dependentes. Estes programas eram inerentemente auto-suficientes porque os beneficiários de transferências sob condição de recursos não têm os meios, isto é, PACs [Comités de acção política] ou lobbies organizados - para "capturar" a elaboração de políticas e, assim, pôr em risco as finanças públicas.
Na medida em que a ajuda social baseada na condição de recursos seja estritamente financiada numa base de tesouraria, tal como foi afincadamente defendido por Milton Friedman, na sua proposta de criação de um "imposto negativo" sobre o rendimento, ela é ainda mais estável do ponto de vista fiscal. Transferências baseadas exclusivamente em fluxos de caixa não alistam nem mobilizam o poder dos lobbies dos prestadores e fornecedores de assistência em espécie, como é o caso da habitação e dos serviços médicos.
O seguro social, por outro lado, sofre da deficiência dupla de ser regressivo no plano distributivo e explosivamente expansionista no plano fiscal. A fonte de ambos os males é o princípio da "substituição do rendimento" proporcionado através da socialização obrigatória distribuída por gigantescos estratos da população.
Do lado do financiamento, a pesada tributação necessária para financiar o sistema foi tornada politicamente viável pela mitologia de que os participantes estão a pagar um "prémio" [hoje] para virem [amanhã] a receber a anuidade proveniente dos respectivos "rendimentos", e não estão a pagar um imposto. Consequentemente, o financiamento através das contribuições sobre os salários é vincadamente regressivo porque todos os participantes pagam uma taxa uniforme independentemente do rendimento.
Do mesmo modo, os benefícios também são regressivos porque aqueles com os salários mais elevados ao longo da sua vida activa têm a maior taxa de substituição [do salário pela pensão de reforma]. Este resultado regressivo é apenas parcialmente atenuado pelos chamados "pontos de curvatura" que proporcionam uma maior substituição no primeiro dólar dos salários abrangidos do que nos últimos.
Os filósofos do seguro social do New Deal fizeram então um pacto com o Diabo [um "pacto faustiano"]. Para conseguir pensões financiadas pelo estado e subsídios de desemprego aos mais necessitados, eles evitaram a condição de recursos e, em vez disso, acordaram numa generosa taxa de substituição do salário numa base universal. Para financiar o custo maciço desses benefícios universais acordaram numa contribuição regressiva sobre os salários disfarçando-a como se de um prémio de seguro se tratasse. No entanto, os resultados de longo prazo não poderiam ter sido mais perversos.
terça-feira, 11 de junho de 2013
O cada vez mais curioso Glenn Beck perdeu a voz
mas proporciona um grande momento de televisão no vídeo que se segue.
P.S. - Pena que tenha escolhido para imagem de fundo aquele que iniciou a destruição da república, pela submissão dos estados ao centro federal, erigindo as fundações do império com uma guerra que ceifou a vida de 750 mil pessoas. Vou admitir que o tenha feito por continuar a ser vítima de um culto que dura há quase 150 anos.
Dos cafés de Silves aos bares e restaurantes dos EUA
Há aí uns 4 ou 5 anos atrás, de visita a casa dos meus pais, durante as férias de Verão, dei conta de uma conversa entre o meu pai e a minha mulher. Sustentava ele, asseverando que tinha chegado àquele número depois de porfiada e demorada contagem entre ele e os seus amigos que Silves, terra de onde todos eles eram naturais e lá residiam há muito, uma cidade de cerca de 11 mil habitantes (de acordo com o último censo), tinha mais de 100 cafés/restaurantes!
Aceitando aquele "recenseamento" como correcto, uma simples conta de dividir (conta de economista, como costumo designar aquela operação aritmética), levava à conclusão da existência à data de um "café" por cada 110 habitantes!
Isto poderia ser um intróito para deixar correr o economês e produzir mais uma arenga acerca dos bens não-transaccionáveis face aos bens transaccionáveis. Vou poupar o leitor a semelhante divagação. Limitar-me-ei a ajudar a difundir um gráfico, retirado daqui. Creio que este é um daqueles casos - é certo que muito raros - que são capazes de provocar epifanias até mesmo às mais empedernidas cabeças (e não lhes assiste senão razão para desconfiarem dos economistas do mainstream).
Ei-lo. Talvez agora possa ficar mais clara a profunda e duradoura malaise por que passam os Estados Unidos.
Clicar na figura para ver melhor |
Se a vergonha fosse um sentimento generalizado
depois desta (que só agora dei conta), a tal de Doutora observaria um silêncio absoluto, na forma oral e escrita, pelo menos por seis meses. Não sendo um homem de fé, duvido muito.
segunda-feira, 10 de junho de 2013
Mitos persistentes: os monopólios resultam da lógica de funcionamento do mercado livre
e, assim, fica "justificada" a intervenção estatal para "resolver" as respectivas "falhas de mercado". Esta é a lengalenga costumeira. E é uma mentira pegada. São os governos que criam os monopólios, os protegem e mantêm. Ontem, como hoje.
Citação do dia (118)
"Que é a maioria? A maioria é tolice. O bom senso sempre tem sido de poucos. Convém pesar os votos e não contá-los."
Friedrich von Schiller
Edward Snowden explica por que fez o que fez
Em entrevista a Glenn Greenwald, o whistleblower que está na origem das fugas de informação sobre as actividades da NSA, está plenamente consciente do que fez. "Não espero voltar a ver a minha terra", assume Snowden, de 29 anos.
domingo, 9 de junho de 2013
Elogio aos whistleblowers em pleno Estado de Vigilância
A torrente de escândalos que vem varrendo estrondosamente a administração de Obama (por que razão só agora?) não conheceu limites ao longo desta semana. Glenn Greenwald, de nacionalidade americana, colunista regular do The Guardian desde o Verão do ano passado (antes escrevia na Salon) que muito aprendi a apreciar, "ameaça" no seu texto de sexta-feira, dia 7 - On whistleblowers and government threats of investigation - que não iremos ficar por aqui. Trata-se, a meu ver, de matéria tão fundamentalmente importante que não é demais sublinhar a dimensão dos insidiosos ataques à liberdade que as fugas de informação revelaram. Não que seja ingénuo ao ponto de ter tido agora uma epifania tardia quanto à natureza do Estado mas para sublinhar a importância do que até agora já se soube.
A tradução do texto de Greenwald é, como habitualmente, da minha responsabilidade.
A tradução do texto de Greenwald é, como habitualmente, da minha responsabilidade.
ACTUALIZAÇÃO: Autor da fuga de informação sobre espionagem nos EUA revela identidade. O seu nome é Edward Snowden.
Assistimos à sucessão da história de quarta-feira, relativa à recolha massiva de registos de chamadas telefónicas por parte da NSA [National Security Agency], por uma outra ontem [quinta-feira, dia 6 de Junho] agora dizendo respeito ao acesso directo, pela mesma agência, aos servidores das maiores empresas prestadoras de serviços de internet em todo o mundo. Não tenho tempo de momento para abordar todas as repercussões destas revelações pois - pedindo emprestada uma frase de alguém - estou ansioso pelas futuras revelações que estão por surgir (o que acontecerá em breve), e não em olhar para trás para aquelas que já vieram à luz.
Mas pretendo assinalar dois pontos. Um acerca dos whistleblowers, e o outro relativamente às ameaças de investigação emanadas de Washington:
1) Desde que a administração Nixon assaltou o escritório do psicanalista Daniel Ellsberg, a táctica do governo dos EUA tem sido a de atacar e demonizar os denunciantes, como forma de desviar a atenção da exposição das suas próprias prácticas preversas, tentando destruir a credibilidade do mensageiro para que todo o mundo não ligue à mensagem. Sem sombra de dúvida, essa manobra também aqui será tentada.
Daniel Ellsberg
Direi algo mais adiante, mas por agora: como estes actos de denúncia são cada vez mais demonizados ("repreensíveis", como ontem os classificou o Director da National Intelligence, James Clapper), disponha o leitor por favor de um momento para considerar as opções disponíveis a alguém com acesso a numerosos documentos classificados de Top Secret [Muito Secreto].
Poderiam enriquecer facilmente vendendo esses documentos em troca de enormes somas de dinheiro a serviços secretos estrangeiros. Eles poderiam tentar prejudicar o governo dos EUA dirigindo-se a um adversário estrangeiro e, secretamente, transmitindo-lhe esses segredos. Poderiam, gratuitamente, expor a identidade de agentes secretos.
Nenhum dos denunciantes perseguidos pela administração Obama, no seu ataque sem precedentes aos denunciantes, fez nada disso: nenhum deles. Nem nenhum daqueles que são responsáveis pela divulgação dos factos correntes.
Eles não agiram com qualquer interesse próprio em mente. A verdade está no pólo oposto: eles incorreram em grandes riscos pessoais e sacrifícios por uma razão abrangente: tornar os seus concidadãos cientes de que o seu governo está a fazer nos bastidores. O seu objectivo é educar, democratizar e responsabilizar os que estão no poder.
As pessoas que fazem isto são heróis. Elas são a personificação do heroísmo. Elas fazem isto sabendo exactamente o que é provável que lhes venha a acontecer pela mão do governo mais poderoso do planeta, mas fazem-no não obstante. Elas não retiram quaisquer benefícios para si destes actos. Eu não pretendo simplificar excessivamente: os seres humanos são complexos e geralmente agem sob motivos mistos e múltiplos. Mas leia-se este notável ensaio sobre as revelações desta semana do especialista em segurança do The Atlantic, Bruce Schneier, para entender por que são esses bravos actos tão cruciais.
Bradley Manning
Aqueles que tomam a iniciativa de expor estes casos raramente retiram daí qualquer benefício . Aqueles que beneficiam são vocês que descobrem o que se deveria saber mas que vos é ocultado : nomeadamente, os actos de maiores consequências que são levados a cabo por aqueles com o maior dos poderes, e de como essas acções estão afectando a sua vida, o seu país e o seu mundo.
Dissociação cognitiva provavelmente letal
De visita a Tóquio, Hollande afirmou hoje, perante uma assistência de empresários, que "o que vocês têm compreender, aqui no Japão, é que a crise na Europa acabou"!
Entretanto, da Alemanha, a notícia é: German court case could force euro exit.
Zangado com os impostos?
Walter E. Williams, em Americans Deserve the IRS, embora não aluda directamente ao recente escândalo protagonizado pela implacável Internal Revenue System (IRS), não tem receio de atribuir a monstruosidade daquela agência governamental às escolhas dos próprios americanos. Escolhas democráticas, como sabemos, ainda que atentatórias da liberdade. Numa linha semelhante, uma semana antes, referindo-se ao diabólico quando não, em ausência de metáfora, criminoso emaranhado regulatório, particularmente no domínio ambiental, escreveu We Are The Idiots.
A tradução, incluindo os trechos realçados, é da minha responsabilidade.
A tradução, incluindo os trechos realçados, é da minha responsabilidade.
Individualmente, os americanos não merecem estar subservientes perante uma agência promotora de temor, intimidante e poderosa como é a Internal Revenue Service; colectivamente, porém, merecemo-lo. Senão, vejamos.
Imagem daqui
Desde a ratificação da nossa Constituição em 1791, até meados da década de 1920, a despesa federal, em percentagem do produto interno bruto, nunca excedeu os 5%, excepto em tempo de guerra. Hoje, a despesa federal representa 25% do nosso PIB. A despesa pública estadual e municipal é de cerca de 15% do PIB. Isso significa que o estado gasta mais de 40 cêntimos de cada dólar que ganhamos. Se somarmos a carga regulatória imposta pelo estado, que não é mais que uma forma disfarçada de tributação [itálico meu], a fatia de que o estado se apossa é de mais de que 50% do que produzimos.
Para que consiga extorquir-nos metade do que produzimos, uma agência estatal de cobrança de impostos tem que ser implacável e capaz de instilar o temor a Deus nos seus cidadãos. A IRS tem-se superado nessa tarefa. O Congresso concedeu-lhe poderes que seriam sido considerados criminosos se usados por outros. Por exemplo, a 5ª Emenda constitucional protege os americanos contra a auto-incriminação e a utilização da força para que testemunhem contra si próprios. Ora, isso é precisamente o que cada um faz ao se ser forçado a assinar o formulário de imposto sobre o rendimento. Todavia, a invocação da 5ª Emenda não pode ser utilizada como meio de defesa em tribunal. A IRS irá contrapor que o cidadão forneceu voluntariamente informações na sua declaração fiscal.
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